Caros amigos, entendo que ao longo da evolução das espécies, vários caracteres se desenvolveram e outros deixaram de existir, tais como diferentes órgãos, membros, tipos de proteínas e coisas afins, tornando as espécies melhor adaptadas para o seu meio. Tudo isso é possível ver nos registros fósseis encontrados pelos Paleontologistas. Todos esses caracteres são produtos de genes presentes no núcleo das células dos organismos vivos. Moléculas fósseis se originam de genes que surgiram nos primórdios da origem da vida. Mas o próprio gene também pode ser uma molécula fóssil. Acredito que podemos considerar moléculas fósseis não só aquelas encontradas preservadas nas rochas , mas também genes não funcionais encontrados em organismos atuais cuja função é conhecida apenas em outra espécie, como é o caso dos genes do dente da galinha, que não são funcionais nas aves mas são funcionais nos mamíferos. Então poderíamos pensar também em genes fósseis funcionais. Ou seja, aqueles genes que foram conservados desde a origem dos primeiros seres vivos e permaneceram funcionais na maioria dos seres até hoje, como é o caso do gene do colágeno que confere firmeza à pele dos mamíferos. Vou tentar elaborar melhor esse pensamento apresentando o Dictyostelium discoideum no contexto da origem evolutiva dos metazoários (organismos pluricelulares).
O Dictyostelium sp. pertence ao reino Protista e ao Filo Unikonta, do qual fazem parte as amebas. Entretanto, é chamado de myxamoebae ou ameba social devido a sua capacidade de formar agregados celulares semelhantes a organismos multicelulares, inclusive apresentando tecido diferenciado com divisão de trabalho. As outras espécies de amebas permanecem solitárias durante todo o seu ciclo de vida. Trata-se de um organismo extraordinário, primitivo e misterioso, que conserva no seu comportamento, os mecanismos que, provavelmente, levaram à evolução dos metazoários.
Nos primórdios da evolução, há aproximadamente 3,5 bilhões de anos, a vida na Terra era exclusivamente unicelular e todos os seres estavam perfeitamente adaptados às condições ambientais existentes. Não havia pensamento, desejo ou intenção. Apenas tentativa e erro na longa evolução molecular impulsionada por forças eletromagnéticas das moléculas presentes no “caldo primordial” que resultariam na primeira célula viva, com metabolismo próprio, capaz de se auto manter e replicar-se de forma autônoma. Foram aproximadamente três bilhões e meio de anos de vida unicelular até o aparecimento dos metazoários.
Vários eventos foram fundamentais para o aparecimento dos metazoários, incluindo: 1) O surgimento da Matriz Extra Celular (MEC) e; 2) o aparecimento das Moléculas de Adesão (MA). 1) A MEC é uma complexa rede de macromoléculas que preenche os espaços extracelulares dos tecidos dos vertebrados e invertebrados permitindo que as células fiquem aderidas ali. Fazem parte dessa rede algumas moléculas fibrosas como os colágenos, entre muitas outras. Isto mesmo! o colágeno da pele do homem é derivado de um gene muito antigo e conservado durante a evolução, que sofreu pouca modificação ao longo das eras geológicas e está presente nos mamíferos, répteis (incluindo dinossauros) e muitos invertebrados, desde vermes e crustáceos até as esponjas marinhas. Daí entende-se que este gene surgiu e se diversificou a partir de um ancestral comum das esponjas e de outros animais, como foi proposto por Morris em 1992. Por estes motivos, o gene do colágeno poderia ser considerado uma molécula fóssil funcional.
2) As Moléculas de Adesão são receptores presentes na membrana das células e permitem a adesão entre as células e entre as células e o colágeno, levando à formação dos tecidos dos metazoários. Existem vários tipos de MA. Entre eles as Integrinas. As integrinas podem se ligar aos colágenos e formar camadas de tecido sobre uma rede de fibras. Os genes das integrinas foram altamente conservados durante a evolução e estão presentes atualmente em uma ampla variedade de espécies, incluindo mamíferos, aves, anfíbios, insetos, fungos e esponjas (Marcantonio & Hynes, 1988). Portanto, o genes dos colágenos e das integrinas são como fósseis moleculares funcionais. Bom! e o Dictyostelium discoideum com essa história toda? Isso fica para a próxima postagem. Grande abraço e até lá.