quinta-feira, 21 de maio de 2009

Interface Fractal

Interface Fractal


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo


ROMANHA, W. S. Interface Fractal. 30 jun. 2009. Disponível em: Editor de postagem: visualização (blogger.com) Acesso em: 


Durante o meu doutoramento na Fundação Oswaldo Cruz, participei do desenvolvimento de uma técnica com físicos e matemáticos para definir os limites da interface biológica entre dois tipos de tecido animal. O conceito de interface, segundo Pierre Lévy, remete a uma superfície de contato, ou  de tradução, ou até mesmo de articulação entre dois espaços, que também podem ser duas espécies ou duas ordens de realidades diferentes. Este conceito serve muito bem à biologia uma vez que ultrapassa o caráter reducionista da física ou da matemática. Para nós, interface biológica é um lugar de fronteira que apresenta características dos dois sistemas. Nas interfaces não se reconhece culturas distintas, ecossistemas bem configurados ou soluções homogêneas. O que existe é uma mistura de culturas, de ecossistemas ou de soluções. É comum na fronteira entre países não se falar nem uma língua nem outra, mas um dialeto emergente, como o “portunhol” na fronteira entre o Brasil e Paraguai.

Em ecologia, o termo utilizado para interface é Ecótono. Nos livros sobre ecologia, ecótono é uma transição entre biomas diferentes, geralmente representada por uma área significativamente menor que as áreas dos próprios biomas adjacentes. A comunidade do ecótono pode conter organismos vegetais e animais de cada uma das comunidades que se entrecortam, bem como possuir outros que só existem lá, como é o caso dos ecótonos sul amazônicos na transição entre o sertão e a floresta amazônica, onde foram registrados endemismos até de primatas como os saguis Mico melanurus e o Mico intermedius.

Ao utilizar um modelo da minha tese de doutorado em patologia experimental, percebi que a "desordem" na interface entre sistemas biológicos poderia ser medida matematicamente para ajudar na sua classificação e compreensão de sua complexidade ou gravidade. Exemplo hipotético: Se pudermos visualizar uma interface entre dois sistemas a partir de uma distância relativa a uma foto de satélite ou por imagens obtidas por um drone, veremos um sistema do tipo A de um lado, um sistema do tipo B do outro e uma zona de transição C entre eles (como uma região de transição entre o cerrado e a floresta amazônica, ou mesmo a transição entre um tecido tumoral e um tecido normal de animais doentes fotografado em microscopia). Nessa imagem perceberemos componentes dos dois sistemas na interface. Para facilitar a visualização, poderemos atribuir cores para cada um dos componentes dos diferentes sistemas. Por exemplo, vermelho para os componentes de A e preto para os de B. Com base nessas cores, desenharemos uma linha de uma extremidade a outra, deixando de um lado os componentes de A e do outro os componentes de B. O resultado fornecerá uma traçado de trajetória sinuosa e irregular pois representará as diversas maneiras com que sementes de vegetais se dispersam no meio (no caso da interface entre dois biomas). Com base nos resultados inferidos hipoteticamente, a dispersão das sementes relacionada provavelmente com as correntes de vento ou mesmo com o transporte das mesmas feito por aves e mamíferos, definirá um traçado de trajetória irregular representativo da interface entre os sistemas biológicos. Este traçado se assemelhará com a trajetória feita por pequenas partículas em meio líquido, chamada de Movimento Browniano (ver primeira figura acima).

Em ciência, coisas que aparentemente não tem nada a ver umas com as outras, às vezes se encaixam perfeitamente a ponto de fornecer respostas para um determinado problema. A trajetória irregular da linha obtida na experiência anterior é semelhante à trajetória que um grão de pólen faz quando suspenso em água. Esse movimento foi observado e descrito pela primeira vez em 1827 pelo Botânico Escocês Robert Brown e ficou conhecido como Movimento Browniano. A partir daí, vários trabalhos foram publicados, culminado com um artigo publicado em 1905 pelo então desconhecido Albert Einstein.

Uma das coisas mais interessantes no Movimento Browniano é que ele possui uma propriedade que os cientistas chamam de auto-similaridade. Isto é, em qualquer aumento (ou escala) a curva parece sempre do mesmo jeitão. Ou seja, à medida em que se observa a curva em diferentes aumentos, ela repete o padrão irregular dos aumentos anteriores (clique na figura abaixo para visualizar em maior aumento). Hoje em dia, uma curva com esse tipo de propriedade é chamada de "fractal".



Assim, a linha irregular traçada entre os sistemas A e B do nosso experimento hipotético descreve uma curva fractal.

A minha interpretação é que essa linha fractal representa o grau de inter-relação entre os sistemas. Ou seja, quanto mais sinuosa ou irregular for essa linha, maior o grau de interação dinâmica entre os sistemas A e B (novas espécies, novos dialetos, florestas típicas, diferentes tipos de solos, etc.). Essa determinação de ser mais ou menos irregular é dada por um cálculo no qual o grau de irregularidade de uma curva fractal pode ser medido através de um índice numérico fracionado que varia entre um e dois. Essa técnica é utilizada em Física e em Biologia para a determinação da dimensão fractal de determinadas interfaces e será discutida aqui mais adiante.

Vou continuar falando sobre fractais no próximo post e tenho certeza de que este conceito ficará cada vez mais claro. Abraços e até lá.

3 comentários:

  1. Gostei muito de seu trabalho aqui no Blog. Atualmente estou desenvolvendo um projeto para uma possível disciplina de divulgação científica para um curso de graduação em Ciências Biológicas.
    Gostaria de saber sua opinião sobre as habilidades a serem desenvolvidas por um aluno neste tema?

    Poderia me encaminhar um email?
    caetanods1(arroba)gmail.com

    Mais uma vez, parabéns pelo trabalho!

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  2. Obrigado Daniel Caetano,
    Ao meu ver, existe uma diferença clara na forma em que biólogos e físicos vêem a natureza. O primeiro percebe as formas em movimento (desenvolvimento embriológico, crescimento de copas de árvores ou raízes, etc.). Para o segundo essas coisas estão paradas. Ex. Ao olhar uma samambaia a maioria dos matemáticos não consegue perceber o que era antes e o que será depois, portanto, qualquer interpretação matemática/biológica estará limitada por este vício. E esse é o grande problema, se você não vê o movimento da natureza, principalmente vegetal, terá dificuldade de fazer previsões ou até mesmo de ampliar conceitos, como é o caso dos fractais. Tudo é fractal para quem vê o movimento das coisas. Para quem só procura propriedades em imagens congeladas pode esbarrar em possíveis limitações.
    Para um curso de divulgação sugiro que sejam convidadas pessoas de áreas diferentes para discutir o mesmo tópico. Antes de fractais, melhor seria que os alunos tivessem alguns módulos sobre sistemas complexos adaptativos, depois fractais e por último computação e bioinformática.
    Um bom professor saberá superar as deficiências históricas dos biólogos em matemática. Mas um conhecimento básico de funções, um pouco de geometria e alguma sensibilidade para programas de computador são desejáveis.
    No próximo post vou continuar em fractais e certamente colocarei boas referências de livros e artigos.
    Abraço.

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  3. esse curso vai ser muito interessante. Seu texto sempre muito claro ajuda muito a seguir o raciocínio.
    Abraço

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