terça-feira, 30 de junho de 2009

A embriologia fractal do Mesozoico - o comportamento fractal.

Muitas pessoas não estão acostumadas com as macro escalas temporais das eras geológicas. Em qualquer situação ou em quase todas o tempo entre uma era e outra compreende um período de milhões de anos. Por exemplo, no post anterior foi sugerido que as gimnospermas apareceram primeiro que as angiospermas ao longo das eras geológicas. As eras geológicas são divisões da escala de tempo relacionadas à evolução geológica do planeta. Também são importantes para situar a idade e o surgimento das espécies vegetais e animais na terra. Assim, a evolução do planeta pode ser dividida em quatro eras, sendo elas: 1) Pré-Cambriano (4,5 bilhões até 570 milhões de anos atrás); 2) Paleozóica (545 milhões até 248 milhões de anos); 3) Mesozóica (245 milhões até 65 milhões de anos atrás) e 4) Cenozóica (65 milhões e 500 mil anos até o presente). Cada era é dividida em períodos. No quadro abaixo estão esquematizados os períodos da era mesozoica:
De acordo com este quadro, do mais antigo para o mais recente temos os períodos triássico, jurássico e cretáceo. Eu tenho especial predileção pela era mesozoica pois compreende os períodos em que floresceram e desapareceram os dinossauros. Tudo isso em mais ou menos 160 milhões de anos. 

Conforme havíamos dito, as angiospermas atuais (plantas com flores e sementes dentro de frutos) teriam surgido apenas no Cretáceo Inferior há cerca de 140 milhões de anos. Antes disso as florestas eram formadas predominantemente por cicadáceas (gimnospermas com folhas semelhantes às das palmeiras, tronco grosso mas nunca chegando à altura de uma árvore), coníferas (árvores e arbustos gimnospérmico chamados de pinheiros ou araucárias), além de pequenos pteridófitos arborescentes (samambaias). Um ambiente geral característico do jurássico é apresentado na imagem abaixo. A partir deste mundo primitivo, sem flores e frutos verdadeiros, surgiram as angiospermas (Cretáceo Inferior há cerca de 140 milhões de anos) e sua explosão de cores, formas e tamanhos. No rastro das flores e seus saborosos néctares, uma variedade enorme de insetos polinizadores em um processo de coevolução animal/vegetal jamais visto. Coincidência ou não, novas evidências fósseis, mas não moleculares, indicaram que o surgimento dos mamíferos modernos data do final do Cretáceo após a extinção dos dinossauros. Em fim, o cretáceo “é o cara”. Ou seja, a emergência dos vegetais e animais modernos tais como os conhecemos hoje. Na imagem abaixo, imaginamos uma geometria representativa da forma com que alguns vegetais ocupavam os espaços no Triássico:

  Ou seja, um mundo com vegetais pouco ramificados e imensos espaços entre eles, permitindo o deslocamento de animais de “grande porte” como no caso dos dinossauros. Com o passar das eras, este mundo se transformou e evoluiu para uma nova organização mais eficiente no seu pragmatismo em fixar carbono e crescer ocupando menos espaço, principalmente em regiões de clima temperado onde as florestas se tornaram mais densas. É o alvorecer de uma nova arquitetura natural, mais complexa e interativa. É a era das aves e pássaros e o fim dos pterossauros (répteis alados). É o surgimento da flexibilidade articular dos mamíferos frente a emergência dos espaços irregulares e profundamente curvos. É o período das ramificações emaranhadas, das redes biológicas que transformaram as florestas em uma malha interligada na qual passaram a transitar inúmeras espécies de insetos, seres alados e mamíferos de médio e pequeno porte. Nos estratos superiores das florestas, uma rede fractal interconecta por cima as copas das árvores e por baixo as raízes que também apresentam um padrão de formação autossimilar. A figura abaixo esquematiza a complexidade adquirida por estas florestas a partir do surgimento das angiospermas. O surgimento das angiospermas está relacionado com as profundas transformações ocorridas desde o período cretáceo. Entretanto, não posso afirmar que este padrão de desenvolvimento seja determinado por um gene embrião fractal que impulsione um comportamento autossimilar de crescimento e distribuição, embora tal hipótese me pareça plausível. O fato é que tanto nas monocotiledôneas quanto nas dicotiledôneas (as duas principais divisões das angiospermas), o crescimento ocorre por um tipo de brotamento no qual estruturas semelhantes (embriões fractais) aparecem como se saíssem umas de dentro das outras, semelhante à ilustração feita por Mariana Massarani exclusivamente para este blog (imagem no alto do texto). Nela, vemos indicado em uma bromélia, as futuras folhas que apresentam o mesmo aspecto geral da planta. Ufa! Por enquanto é só.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Um pouco de tudo e mais fractais

Algumas coisas ainda me deixam perplexo. Recentemente fui convidado de última hora para uma entrevista que tinha por objetivo confrontar a opinião de um cientista contra a de um teólogo a respeito da teoria da evolução. Tratava-se de uma monografia de final de curso de comunicação. Me surpreendi com a iniciativa uma vez que no próprio objetivo do projeto subtendia que “teoria da evolução” para muitos ainda era uma questão de crença baseada em opiniões próprias. Não é! Ainda estamos cometendo enormes equívocos por conta de um resquício de polêmica entre crença e conhecimento, e isto a epistemologia explica muito bem. A Teoria da Evolução é um fato sustentado por várias evidências científicas fornecidas pela paleontologia e geologia a partir de inúmeros achados fósseis e geológicos, todos devidamente datados por métodos cada vez mais sofisticados. E não para por aí! Áreas do conhecimento tais como genética, biologia molecular e anatomia comparada fornecem cada vez mais subsídios para a compreensão da evolução, algo que para cientistas e pessoas atentas não tem nada a ver com crença mas com conhecimento. O que eu estou querendo dizer? Que a ciência não pode ser contestada? Não é isso! A ciência pode e deve ser contestada pois este é um dos mecanismos do seu avanço. Entretanto, a ciência deve ser contestada com mais ciência, pois quando o conhecimento científico passa a ser encarado como uma crença irrefutável, intocável e imutável, torna-se dogmática e estabelesse-se aí as condições para o seu fracasso. É isso que se chama paradigma engessado (ver o livro pensamento sistêmico, pg. 33). O ideal é que as mudanças de paradigmas ocorram continuadamente. Vejamos um exemplo prático:

Voltando ao tema fractais
Para quem leu os últimos posts já sabe quase tudo sobre fractais. Para quem não leu fica aqui o convite para que o faça ou assista o vídeo apresentado pelo matemático espanhol Antonio Pérez Sanz. Durante a minha tese eu estava bem empolgado com o tema fractais e pedi a um aluno de iniciação científica que pesquisasse na internet algo interessante sobre esse tema. Ele me trouxe um artigo chamado “Caos e linguagem dos fractais”. Infelizmente o link que daria acesso ao artigo está corrompido, mas se você quiser saber mais sobre os autores do artigo “André Calixto Vieira” e “César de Oliveira Lopes” faça uma pesquisa na internet. Pois bem, junto com o artigo veio um conceito interessante chamado “embrião fractal”. Para Vieira e Lopes (2003), o embrião fractal é o elemento fundamental da figura, ou seja, aquele que se mostra repetitivo em qualquer escala (lembra-se do que falamos sobre autossimilaridade?). Então, se uma árvore possui ramos que se ramificam “infinitamente”, o embrião fractal, ou elemento fundamental da copa da árvore será uma imagem semelhante a uma forquilha. Concorda?

A ideia de um embrião fractal é ótima pois permite a visualização de uma estrutura fractal no tempo, isto é, dentro de um processo dinâmico de desenvolvimento e crescimento. Assim, mesmo formas da natureza que não se parecem com uma estrutura fractal podem ser classificadas como fractais por terem um comportamento fractal. Basta identificar o embrião fractal e verificar se durante o crescimento da estrutura ele aparece novamente, e assim por diante. Para exemplificar o que eu estou dizendo, vemos colocar os vegetais em termos de classificação e evolução.

Dos chamados vegetais superiores temos as Gimnospermas (plantas como as araucárias e pinheiros que possuem sementes sem frutos) e as Angiospermas (orquídeas, mangueiras, bananeiras e uma infinidade de outras plantas que possuem sementes dentro de frutos). Não se sabe ao certo se as angiospermas evoluíram das gimnospermas ou se ambas possuíram um ancestral comum (Crane 1988, Doyle et al. 1994, Price, 1996). O que se sabe é que, de acordo com os registros fósseis, o apogeu das gimnospermas ocorreu durante o baixo e médio Mesozóico (Triássico e Jurássico) e as angiospermas atuais teriam surgido apenas no Cretáceo Inferior há cerca de 140 milhões de anos . Veja a figura abaixo.

Neste momento nos interessa aprofundar o assunto apenas sobre as angiospermas. Estudaremos nas angiospermas os seus dois principais taxons (monocotiledôneas e dicotiledôneas) e as diferenças nas suas vasculaturas. Vamos fazer o seguinte, este post está ficando grande demais e não é a nossa intenção. Me comprometi em discutir a importância do conceito de embrião fractal, sua aplicação na biologia e na evolução das angiospermas e isso parece ter relação com o sistema vascular das monocotiledôneas e dicotiledôneas e outras coisas mais. Então, esperem mais uma semana, ou menos, e tudo isso ficará bem colocado. Grande abraço e até lá.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Fractais na Natureza


Fractais na Natureza


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo


ROMANHA, W. S. Fractais na natureza. 30 jun. 2009. Disponível em: < http://microsintonias.blogspot.com/2009/06/fractais-na-natureza.html>. Acesso em: 



No último post sugeri que as desordens encontradas nas interfaces entre sistemas biológicos poderiam ser entendidas utilizando o conceito de geometria fractal. Para que algo seja considerado fractal é necessário que se tenha uma propriedade fundamental denominada autossimilaridade. Apesar da ideia de fractais estar atrelada a um conceito estritamente matemático, inúmeras formas encontradas na natureza satisfazem as condições necessárias para que sejam consideradas fractais. Um bom exemplo é a copa das árvores. Em uma árvore típica, a formação da copa começa a partir das ramificações iniciais do tronco. De forma similar às primeiras ramificações, cada ramo principal sofre novas ramificações que se repetem até as ramificações terminais onde surgem as folhas. Observe o exemplo abaixo. Nesta árvore, a autossimilaridade está esquematizada ao lado.

No esquema acima, utilizando o modelo encontrado no livro de Mendelbrot (1977) e modificado por Goldberger (1987), resolví comparar uma imagem verdadeira de uma árvore sem folhas.  Ali podemos perceber os ramos “infinitos” de uma árvore. Observe que a cada vez que um dos ramos é ampliado, revela a presença de novos ramos, e assim por diante, sugerindo que o galho se ramifica por inúmeras gerações em escalas cada vez menores tendendo ao infinito. Isto é autossimilaridade! Qualquer estrutura em menor escala é similar a forma em maior escala. É como se a árvore fosse formada por milhares de pequenas árvores progressivamente menores (Mandelbrot, 1977, West & Goldberger, 1987).

Mesmo ao nível de uma folha podemos perceber a autossimilaridade tal qual observamos nos galhos da árvore. Genericamente, as folhas são divididas nas seguintes partes: bainha, pecíolo e limbo. O pecíolo surge das ramificações menores das árvores. Conforme a figura mostra, o pecíolo gera vários ramos que se ramificam posteriormente. O limbo nada mais é do que a parte verde da folha ou tecido vegetal formado por células fotossintetizantes. Assim, o pecíolo é a continuação de um sistema vascular que se origina na raiz da planta com o objetivo de transportar seiva bruta para as células da folha (o limbo). As ramificações desde o tronco até os ramos terminais dos pecíolos reproduzem um padrão também observado no sistema vascular dos mamíferos. Ou seja, as ramificações terminais dos pecíolos equivalem aos capilares sanguíneos que se originam das arteríolas do nosso corpo e nutrem as células na intimidade dos tecidos; ou as ramificações terminais da árvore brônquica (bronquíolos do pulmão) que ao nível dos sacos alveolares realizam as troas gasosas. Tanto as ramificações dos pecíolos dos vegetais quanto os capilares sanguíneos e os bronquíolos são pequenos e finos o suficiente para interagirem diretamente com as células de cada tecido correspondente, e todos eles reproduzem um padrão fractal.

Quando as folhas das árvores caem no solo de uma floresta úmida o limbo é a primeira estrutura a ser decomposta pelos microrganismos presentes. Como resultado, sobra apenas o esqueleto da folha formado pelas ramificações do pecíolo que pode ser encontrado no chão da floresta.

Assim, conforme demonstramos, o esqueleto da folha apresenta uma estrutura autossimilar que satisfaz todas as condições de uma estrutura fractal.

Então, como primeira conclusão, o estudo das formas fractais presentes na natureza corresponde a um tipo de geometria da natureza. Entretanto, é uma geometria que não tem nada a ver com as formas que estamos habitualmente acostumados tais como esferas, polígonos ou mesmo os sólidos platônicos (figura abaixo) que a partir dos quais Platão procurou explicar o universo.


Platão buscou nos sólidos regulares a explicação para a origem do universo. Da esquerda para a direita temos: octaedro, icosaedro, cubo (ou hexaedro), tetraedro e um dodecaedro.

Do ponto de vista do pensamento matemático antigo, alguns estudiosos importantes como Galileu e Descartes foram obcecados por encontrar nos resultados de suas pesquisas figuras geométricas ditas perfeitas como a parábola, a elipse e o círculo. Acreditavam que a natureza não tinha muita escolha na formalização dos seus fenômenos que não os traçados bem comportados descritos por Euclides (Revisado em Ricieri, A. P., 1990). Hoje, sabe-se que as formas da natureza não obedecem apenas a lógica da geometria clássica ou Euclidiana. O matemático Francês Benoit Mandelbrot, um dos pais da geometria fractal, havia percebido isto muito antes de 1983 quando declarou o seguinte no seu livro A Geometria Fractal da Natureza: “nuvens não são esferas, montanhas não são cones, linhas costeiras não são círculos, cascas de árvores não são suaves e nem o raio se propaga em linha reta”.


"Formas da natureza que não obedecem as leis matemáticas da geometria clássica ou Euclidiana"

Essas afirmações deixam claro que as formas ou a geometria da natureza respeitam outras leis geométricas. Estas não são definidas apenas pelas dimensões tradicionais, ou seja, a primeira (a reta), segunda (o quadrado) e terceira dimensões (o cubo), mas também pela dimensão dos fractais na qual a autossimilaridade é a principal propriedade (mas não a única).

Qual é a importância dos fractais em biologia? Segundo um cientista chamado Cross (1994), a dimensão fractal pode ser entendida como uma medida de complexidade. De fato, a função de vários órgãos do corpo dos mamíferos bem como a atividade das plantas está relacionada diretamente com a forma adquirida por eles ao longo da evolução. Nós aprendemos nos primeiro e segundo graus que as células do intestino possuem vilosidades e que estas por sua vez possuem microvilosidades. A análise dessas vilosidades mostrou que elas possuem um padrão fractal (microvilosidades que surgem de vilosidades, que surgem de dobras intestinais e que por sua vez surgem das alças curvas intestinas, e assim por diante). A disposição das microvilosidades intestinais potencializa o nível de absorção de nutrientes para o interior da célula devido ao aumento da área ou superfície de contato com os alimentos. Isto só ocorre porque a estrutura é fractal.

O mesmo acontece com as árvores. A disposição fractal da copa das árvores potencializa e maximiza a exposição de uma quantidade enorme de folhas ao sol, permitindo maior eficiência na captação de luz. A disposição fractal das árvores adultas também permite que elas lancem novos ramos durante todo o ano sem que o aumento do perímetro da copa seja perceptível. Então, uma estrutura fractal fornece o máximo de eficiência com o mínimo de ocupação de espaço. Veja o caso dos vasos sanguíneos dos animais.

No caso dos vasos sanguíneos, a natureza de suas ramificações é fractal e como tal tende a um crescimento infinito. Assim, apesar do sangue ocupar pouco espaço, não mais do que 5% do corpo, na maioria dos tecidos nenhuma célula está a uma distância de mais de três ou quatro células de um vaso sanguíneo (Gleick, 1989).

Para concluir, a propriedade fractal da uma determinada vegetação é determinante para o tipo de fauna existente ali. Quanto mais complexa a trama verde de uma floresta, mais favorável será para a presença de pequenos artrópodes e assim por diante. Se você quiser saber mais sobre fractais veja o seguinte site: http://math.rice.edu/~lanius/frac/ ou baixe o programa WINFRACT para windows e divirta-se.

Grande abraço e até a próxima.
 
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