quinta-feira, 22 de julho de 2010

"Ecossistemas de Menger"

O conceito sobre complexidade biológica tal qual exposto nos artigos “embriologia fractal do mesozoico” e “interface fractal”, e reconstruído aqui, introduz o “ressignificado” de ecossistema e dimensão fractal. Interessa-nos neste e nos próximos artigos reforçar a ideia de seres vivos ou ecossistemas como sistemas complexos biológicos com dinâmica fractal.

Os sistemas naturais são formados por componentes que estabelecem entre si relações intra e interespecíficas. Essas relações não são lineares e por isso mesmo desprovidas de sentido vetorial ou direção claramente previsível. Isto é mais evidente em micro escalas (tema para outro texto). Assim, os sistemas naturais são imprevisíveis e mutáveis mas não obrigatoriamente instáveis. A melhor imagem para representar a complexidade dos ecossistemas é a de uma rede cujos os nós representam os componentes do sistema, e as linhas que comunicam os nós, representam os sentidos ou as direções das informações que circulam pela rede. Entretanto, trata-se de uma rede quadrimensional (ou n-dimensional) que configura uma  intrincada malha de conexões com design biológico próprio, mutável, e mais do que provavelmente, fractal. Ou seja, cada componente ou nó do sistema representaria uma rede em menor escala, sustentável, autossimilar, tendendo ao infinito. Assim, cada nó da rede, de forma aparentemente sólida,  seria semelhante a uma esponja com área de superfície infinita e volume nulo (vide Esponja de Menger acima).

Este conceito sugere uma estrutura organizada no qual os sistemas observados em macro escala suportam subsistemas em escalas progressivamente menores. A observação detalhada dos subsistemas revela instâncias ainda menores e de complexidade semelhante. Alterações em qualquer nível refletem alterações a nível global.

Vamos imaginar o bioma Mata Atlântica presente na maior parte no território brasileiro. Este grande sistema é composto por vários ecossistemas diferentes, entre eles as florestas atlânticas. Na Mata Atlântica distinguem-se no mínimo quatro tipos de florestas além de mangues, restingas, campos e brejos de altitude. Esta configuração corresponde a ecossistemas dentro de ecossistemas em escalas progressivamente menores. Nestas florestas ou ecossistemas, comuns no Rio de Janeiro, predominam Jequitibás (ao lado), Ipês, Jacarandás, Palmeiras, Leguminosas, Astroniuns, Sapucaias entre centenas de outras espécies lenhosas, arbustivas, trepadeiras e epífitas como as orquídeas e bromélias. Além de toda a diversidade vegetal, circulam nestes ecossistemas uma grande diversidade de animais que realizam os seus ciclos de vida por entre territórios delimitados e/ ou  superpostos dentro do grande ecossistema complexo chamado Mata Atlântica. Entre eles podemos destacar primatas, felinos, aves, tamanduás, insetos, cobras, jacarés, sapos entre outros.

Dentro de um conceito ampliado do que seja ecossistema, podemos distinguir micro ecossistemas presentes nas copas das árvores, nas cascas das árvores ou nos cálices das bromélias, entre outros. Os cálices das bromélias são importantes na natureza e são vistos pela maioria dos ecólogos como ecossistemas completos. Então, vamos aprofundar o entendimento sobre estes micro ecossistemas de bromélias como exemplos de componentes vitais para o funcionamento e entendimento dos nossos ecossistemas interligados em rede complexa com dinâmica fractal.

Existem mais de duas mil espécies de bromélias no mundo. Para alguns autores este número pode chegar a três mil conforme relatado no ótimo livro "Bromélias da Mata Atlântica" de Elton M. C. Leme. Segundo Leme, pelo menos 40% desse universo podem ser encontrados no Brasil, o que faz do país o mais importante em termos de diversidade.

Cada bromélia tem uma capacidade especial de armazenar água em suas folhas e é aí que está o segredo. Esta água é, geralmente, límpida e transparente, e fica armazenada entre as folhas bem no centro da planta chamada de cálice. A água das bromélias é rica em sais minerais, ácidos orgânicos e outros nutrientes que fazem das bromélias micro ecossistemas fundamentais dos quais dependem centenas de organismos. Além das famosas larvas de mosquitos, dentro ou em torno das bromélias vivem libélulas, aranhas (como a caranguejeira Pachistopelma rufonigrun endêmica de bromélia retratada na imagem abaixo), sapos, pererecas, aves, morcegos, cobras e crustáceos. São 400 a 500 espécies de animais que estão de alguma forma relacionadas às bromélias. Muitas fazem das plantas sua moradia. Outras as frequentam para caçar, beber ou apenas molhar a pele. Outras ainda as polinizam ou buscam seu néctar e frutos. No calor das restingas ou no auge da seca do sertão nordestino, dos cerrados e das matas do Centro-Sul brasileiro, as bromélias também são fonte de água para anfíbios e répteis, aves e até mesmo mamíferos, como saguis, micos, macacos, cachorros-do-mato e quatis.

A melhor imagem que tenho das bromélias interagindo em ecossistemas foi impressa na minha mente a partir de um trabalho que realizei durante a faculdade de Biologia, na restinga de Massambaba - RJ. Era um marimbondo caçador buscando atividade em torno de uma Edmundoa lindenii em flor (a baixo sem o marimbondo). Recentemente tive um grande problema com larvas de Aedes aegypti (mosquito vetor do vírus da dengue) nas bromélias do jardim da Universidade Veiga de Almeida em Cabo Frio. O problema foi resolvido com treinamento dos funcionários na eliminação das larvas e dos ovos dos mosquitos bem como de outros criadouros realmente importantes.

Imagine uma floresta ou restinga sem bromélias. Em ambientes de restinga, às vezes as bromélias são os únicos suprimentos de água doce disponível para pequenos animais, sendo capazes de armazenar o equivalente a um copo ou um balde cheio de água a depender do tamanho da bromélia. A eliminação destas plantas impactaria toda a diversidade taxonômica gerando um colapso em todo o grande ecossistema, alterando inclusive o microclima, uma vez que as bromélias são fundamentais para a regulação do mesmo. Então, podemos enxergar as bromélias como importantes bioindicadores da saúde de ecossistemas tropicais.

Como pudemos ver, as bromélias são bons exemplos de componentes pertencentes a grandes redes de ecossistemas que ajudam na manutenção de todo o sistema. Redes fractais como modelos de sistemas naturais são ideias matemáticas úteis que ajudam a explicar fenômenos biológicos observáveis. Entretanto, como poderíamos desenhar esta rede? Que geometria fractal poderia representar tamanha interação de modo que na sua arquitetura tivéssemos um tipo de Esponja de Menger diferenciada para cada subsistema interligado em rede? Nesse ponto a interação entre biólogos, físicos e matemáticos poderia ser útil na construção desta representação gráfica para este hipotético "Ecossistema de Menger". O ecossistema artificial de Menger seria suportado por algoritmos que, por sua vez, estariam baseados em proposições matemáticas. Então, estamos falando de modelos matemáticos formados por parâmetros e variáveis. Tais parâmetros e variáveis seriam representações numéricas dos componentes dos ecossistemas reais. Alterações nos parâmetros do modelo gerariam modificações na arquitetura gráfica do ecossistema artificial de Menger. Isto significaria uma ferramenta poderosa para o estudo in sílica de ecossistemas alterados ou impactados.

Quem aceita o desafio de modelar os "Ecossistemas de Menger"?

Grande abraço e até a próxima.

sábado, 14 de novembro de 2009

Introdução à complexidade biológica

Encontros e mudanças

A vida surgiu de um pequeno sistema singular adaptativo e cheio de potencial transformador, dotado de complexidade suficiente para se replicar em novas formas replicantes. Um sistema capaz de gerar toda a diversidade biológica encontrada hoje e com plasticidade suficiente para se diferenciar nos mais diversos tipos de tecidos componentes dos vertebrados ditos superiores: A célula. Surgida provavelmente há mais de três bilhões de anos em ambientes lamacentos ou mares rasos e quentes do Pré-cambriano, ali viveu e evoluiu por milhões de anos tal qual vivem e evoluem muitos organismos unicelulares como bactérias e protozoários que são encontrados até hoje nas bordas das lagoas poluídas como as de Araruama em Cabo Frio RJ, e tantas outras por esse Brasil afora.


Desde o advento da vida, tudo mais foi encontro e mudança. Pude promover um desses encontros entre alunos universitários e microrganismos planctônicos em laboratório. Foi simples: a partir de uma rápida ida ao campo, o material foi coletado, preparado e exposto em sistema fechado de vídeo-microscopia. Bastou apenas um fragmento de ecossistema encontrado em uma gota de água poluída cuidadosamente coletada para que a natureza se expressasse com todas as suas cores e diversidade biológica bem na nossa frente. A diversidade biológica estampada em alguns monitores de televisão e o espanto da espécie dominante frente ao inimaginável. Um encontro transformador com força suficiente para mudar perspectivas e alterar caminhos daqueles que curtem a natureza.

Sem misticismo, a ciência nos leva a uma reflexão sobre a origem comum dos seres e nos coloca na dimensão da matéria como qualquer outro ser vivo. Ou seja, os organismos coevoluem vivendo juntos na natureza e se diversificam a partir dos encontros quer sejam sexuais, cognitivos, parasitários ou simbiônticos, gerando a enorme diversidade biológica observada. Essa diversidade é dependente do ambiente e por isso mesmo se apresenta diferente em cada diferente local.


Isso me fez lembrar de um dos meus grandes momentos na Biologia. Foi em 1981, aos 15 anos de idade, dentro de uma sala de aula de ensino fundamental e público, estudando a diversidade da fauna marinha apresentada sobre a bancada do laboratório de biologia pela professora de ciências. Era a primeira vez que, hipnotizado, eu observava a complexidade dos tentáculos de uma lula, a disposição das escamas das diversas espécies de peixes e o admirável exoesqueleto dos crustáceos marinhos. Isso foi em Resende - RJ.


Antes disso, minha experiência no campo da biologia era totalmente empírica baseada em aventuras vividas em Brasília na minha pré-adolescência. Naquele ambiente de cerrado, experimentei acampamentos, pescarias e trilhas onde era possível ver, livres na natureza, animais silvestres como: emas, tatus e até mesmo lobos Guará, entre muitos outros tipos de animais vertebrados terrestres e aquáticos. Infelizmente, nunca tive a sorte de encontrar uma onça-pintada, vista ainda em quantidade significativa nas zonas menos povoadas, como no Parque Nacional da Chapada dos Viadeiros.

Quando me mudei para o Sul do Estado do Rio de Janeiro, me surpreendi com aquele novo encontro. Fiquei emocionado ao ver pela primeira vez no Município de Itatiaia, bem na divisa com o Estado de São Paulo, o Maciço de Itatiaia, uma enorme rocha cujo ponto mais alto é chamado de Pico das Agulhas Negras.
Era o máximo do contraste entre dois ecossistemas. De um lado o cerrado de Brasília, o segundo maior bioma do Brasil, com suas árvores retorcidas, estações seca e chuvosa bem definidas (clima tropical semi-úmido) e uma "umidade relativa do ar" as vezes abaixo de 25%, com sol escaldante de dia e “muito” frio durante a noite. Por outro lado, a umidade chuvosa de Resende, cidade encravada em uma imensa bacia sedimentar e cortada por um Rio magnífico chamado de Paraíba do Sul que, com seus braços, hidratam imensos vales onde se desenvolve e evolui uma rica e diversa fauna e flora típicas de Mata Atlântica. Seus vales e florestas formados a partir de levantamentos rochosos como os da Serra da Mantiqueira estão hoje protegidos pelo Parque Nacional de Itatiaia, o primeiro do Brasil, com latitudes que variam de 580 a 2.787 metros.

Uma vez fazendo uma escalada pelas muitas vias do Itatiaia, fui apresentado por um amigo estudante de biologia a um líquen, forma de vida extremamente curiosa, constituída pela simbiose entre fungos e algas e capaz de se adaptar a regiões inóspitas do tipo “costão rochoso”, tal qual aquele em que estávamos pendurados apenas por um cabo. Ali, ele me explicou que as algas eram as responsáveis pela fotossíntese no sistema simbiôntico, sem a qual não poderiam sobreviver como líquen. Fiquei sabendo que os liquens faziam parte do ecossistema e que sua conservação era importante para a conservação de todo o sistema. Comecei a entender que os sistemas estavam todos inter-relacionados, desde as formas mais simples até as mais complexas.


Um bom exemplo de inter-relação são as formigas nos parques de Moscou, Rússia. Lá, em 2006, descobriu-se uma relação entre o adoecimento das árvores e o desaparecimento de um determinado tipo de formiga dominante daquele lugar. O motivo era relativamente simples. O suprimento de alimento das formigas estava diminuindo devido ao trabalho da limpeza feito pela prefeitura, causando impacto sobre as mesmas. Sabe-se que algumas espécies  de formigas  são úteis aos ecossistemas por predarem parasitos de plantas, como no caso das formigas Russas.  Além disso, com a diminuição da população de formigas, houve um aumento na população de lagartos, outro tipo de alimento dessas formigas. Assim, sem o controle da população de lagartos,  a taxa de natalidade aumentou vertiginosamente e as copas dos carvalhos, alamos, tílias e bétulas foram devoradas, contribuindo para a morte da floresta. Considerando que cada formigueiro com um milhão de indivíduos (número limite) é capaz de manter uma área de 10 mil metros quadrados livre de pragas, a conservação das formigas é vital para qualquer parque ou floresta (ANSA 10/10/2006 11:58)

Este e outros exemplos mostram que o equilíbrio dos sistemas biológicos depende das relações entre as diferentes espécies. Alterações em algum nível pode repercutir desequilíbrios de amplo espectro. Entretanto, todos os seres vivos ou mesmo ecossistemas inteiros sofrem alterações ao longo do tempo, quer sejam por interferência humana ou da própria dinâmica natural. Algumas alterações são positivas e permitem que os seres saltem para novos estados de maturidade com o próprio meio. Outras podem levar ao desaparecimento de todo um ecossistema. Assim, as coisas existem em equilíbrio dinâmico, modificando-se a partir das interações entre si ao longo do tempo. Quer seja um líquen, um passarinho, seres humanos ou uma floresta, todos passam por um estado embrionário, amadurecem e se transformam ao longo dos seus encontros ou interações naturais. Eu mesmo mudei desde o tempo em que, pendurado em uma rocha do maciço de Itatiaia, tive um encontro com um líquen.

Abraços e até breve.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

A origem da vida no planeta azul

A vida é quase tão antiga quanto o próprio planeta Terra. A Terra surgiu há pouco mais de quatro bilhões de anos a partir de um condensado de poeira estelar rico em gases do tipo hidrogênio, hélio, carbono, nitrogênio, oxigênio, ferro, alumínio, ouro, urânio, enxofre, fósforo, silício e, provavelmente, alguns fragmentos de rocha. A essa altura o nosso sol ainda era uma protoestrela localizada em um dos braços da via láctea prestes a emitir radiações que impulsionariam novos processos na evolução da Terra primitiva. Isto se deu a partir do início da fusão nuclear do hidrogênio no sol, levando-o ao status de estrela jovem. O advento da radiação solar sobre a Terra primitiva alterou a atmosfera fazendo com que o hidrogênio se combinasse com o carbono, com o oxigênio, com o nitrogênio e com o enxofre para formar, respectivamente metano (CH4), água (H2O), amônia (H3N) e gás sulfídrico (H2S), ou seja, as primeiras moléculas que muito mais tarde permitiriam o surgimento da vida ou, como declararam as cientistas Lynn Margulis e Dorian Sagan no livro “Microcosmos”, os ingredientes da receita da vida. Por outro lado, os elementos químicos mais pesados e instáveis como o urânio, tório, potássio, ente outros, se concentraram no núcleo do planeta e, devido suas capacidades de emissão de radiação muito forte, mantiveram a Terra aquecida por milhões de anos como um planeta incandescente. Há quatro bilhões de anos atrás o núcleo da Terra era o grande gerador de energia do planeta em desenvolvimento, produzindo calor muito acima dos 5.000 graus atuais do centro para a periferia a partir da sua atividade radioativa.
À medida que os elementos radioativos eram consumidos no núcleo do planeta, a Terra se resfriava progressivamente a um ponto em que, há aproximadamente três bilhões e novecentos milhões de anos atrás, formou-se uma crosta porosa na superfície por entre as quais eram lançados jatos violentos de lava incandescente e vapor de água que desenhavam novas topografias a cada momento e formavam densas nuvens na atmosfera.

Eram os vulcões ativos que funcionavam como válvulas de escape para o magma incandescente (rocha derretida) mantido a altíssimas pressões no manto, a mais ou menos 150 km de profundidade abaixo da crosta terrestre em formação. Algumas atividades vulcânicas de grande magnitude provocadas pela movimentação e choque de placas tectônicas (imensas placas ou fragmentos gigantescos da crosta correspondentes aos continentes primitivos que flutuavam sobre o magma e eventualmente se chocavam) liberavam gases retidos no interior do planeta formando uma nova atmosfera composta por vapor de água, nitrogênio, argônio e dióxido de carbono.

Com o resfriamento progressivo da Terra, diferentes elementos químicos tais como ferro, ouro, cobre, chumbo, urânio, zinco, e muitos outros metais pesados foram alcançando os seus pontos de solidificação na crosta, formando assim imensas jazidas minerais que são exploradas pelo homem até hoje. A coisa funciona mais ou menos assim. Tudo que existe pode existir em diferentes estados a depender da temperatura e pressão que estão submetidos. O Ferro, por exemplo, pode ser encontrado em estado líquido, sólido ou gasoso. Entretanto, cada elemento possui um ponto de solidificação que é igual ao ponto de fusão (passagem do estado líquido para sólido e vice versa). Considerando o ponto de fusão dos diferentes elementos (Chumbo = 327°C; Ferro = 1500°C; Ouro = 1064,1800ºC; Alumínio 961,7800ºC; Zinco = 660,3230ºC, Cobre = 1084,6200ºC), cada um se solidificou a seu tempo, na medida do resfriamento do planeta. Assim, por entre a crosta semissólida do planeta em desenvolvimento, o que não estava solidificado fluía como rios de metais líquidos que se juntavam cada qual de acordo como a sua especificidade até se solidificarem em algum momento do resfriamento natural do planeta. Dessa maneira, ao longo de milhões de anos, a Terra foi adquirindo o seu formato atual.

O cenário da Terra no início do Arqueano (inicia-se a três bilhões e novecentos milhões de anos e termina a dois bilhões e quinhentos milhões de anos atrás), também chamado de Era Pré-cambriana, era o de um planeta repleto de vulcões profundamente ativos e mares rasos e quentes formados pela condensação na atmosfera do vapor de água que fora anteriormente expelido pelos vulcões.

Durante todo o período em que se deu a violenta evolução geológica do planeta, átomos se misturaram e formaram gases que se recombinaram e formaram cadeias de macromoléculas com as mais diversas texturas e formas. Não se sabe muito bem onde e como a vida surgiu mas, apesar das divergências entre os biólogos, acredita-se que tenha sido em um ambiente quente, úmido e lamacento do Pré-cambriano, onde diferentes tipos de gases e moléculas deram continuidade a processos impulsionados por forças eletromagnéticas a partir de inúmeras tentativas e erros.

O que se sabe é que ao se reproduzir experimentalmente a atmosfera primitiva (mistura de metano, vapor de água, hidrogênio, amônia e vários outros gases) submetendo-a a diferentes fontes de energia tais como descargas elétricas, radiação ultravioleta e calor, uma condição semelhante a realidade da atmosfera do Arqueano, são formadas moléculas que antes acreditava-se serem produzidas apenas por células vivas. Inúmeros experimentos semelhantes a este (imagem ao lado), que originalmente foi feito por Stanley L Miller (Nobel de química em 1953), foram realizados por outros pesquisadores. Os resultados mostraram que as simulações geraram os quatro aminoácidos mais abundantes das proteínas existentes em todos os seres vivos. Também foram encontradas moléculas de ATP (molécula que armazena energia no interior das células) e todas as cinco bases nucleotídicas que compõem o DNA e RNA (adenina, citosina, guanina, timina e uracila), entre outros compostos fundamentais para a organização da vida tal qual a conhecemos. Por fim, é fato geológico conhecido que no Arqueano foram encontrados os primeiros vestígios de vida na Terra. Entre eles, se destacam os microfósseis de bactérias filamentosas no oeste da Austrália e os estromatólitos (estruturas formadas por colônias de algas,) no sul da África e oeste da Austrália.

Os estromatólitos (fósseis comuns na Terra) são as poucas
evidências geológicas da existência de vida no período entre 3,5 bilhões e 600 milhões de anos atrás.


As bactérias e algas primitivas do Arqueano assimilavam o dióxido de carbono ricamente presente na atmosfera e liberavam oxigênio livre. Este comportamento foi fundamental para o surgimento de outras formas de vida em função da substituição do dióxido de carbono pelo oxigênio livre na atmosfera terrestre.

Bom, não sei quanto a vocês, mas eu acho tudo isso fantástico!
Grande abraço e até a próxima.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

A Natureza da Natureza


O céu no hemisfério sul possui constelações típicas com as quais crescemos e nem nos damos conta. Quem nunca ouviu falar no Cruzeiro do Sul ou nas Três Marias? Pois bem, na madrugada do dia seis de julho olhei casualmente pela janela e vi um aglomerado de estrelas bem na minha frente. Após fazer as considerações necessárias entendi que se tratava de um grupo de estrelas denominado coletivamente de Plêiades.

Faz parte deste aglomerado uma estrela chamada Carina que em conjunto com outras tantas constituem a constelação de Carina ou Quilha. Assim, o aspecto das plêiades em noites sem lua é de um ponto brilhante e esfumaçado no céu (vide primeira figura) que faz parte da constelação de Carina. Neste inverno, mais especificamente no mês de julho, as Plêiades podem ser vistas duas vezes por noite, uma delas aproximadamente às seis horas no horizonte e a outra a partir das 21:00. A figura ao lado é uma simulação da configuração do céu feita no dia 15/07/09 às 21:00 utilizando o programa Stellarium 0.10.2.

Pois bem, este céu apresentado na simulação me aproximou novamente do meu velho telescópio e da pergunta mais antiga da humanidade: De onde viemos? O estudo da astronomia tem sido importante por vários motivos, entre eles o fato de que toda forma de vida existente no nosso planeta é derivada de componentes básicos forjados nas estrelas durante sua evolução. Estes componentes são os átomos que formam tudo o que existe na Terra incluindo as moléculas e as células que compõem o nosso corpo. Assim, se o nosso corpo é formado por células que por sua vez são formadas de moléculas e estas por átomos, logo somos seres estelares. Essa história começa mais ou menos assim:

No início era o caos parcialmente desestruturado! É consenso entre os astrônomos que o nascimento de novas estrelas e até mesmo galáxias tem início na explosão de estrelas muito antigas e pesadas, formadas eventualmente de silício e ferro56, entre outros. Essas estrelas são chamadas de supergigantes vermelhas. Sempre que você olhar para o céu e ver uma estrela com um brilho avermelhado trata-se de uma gigante vermelha. Os astrônomos dizem que essas estrelas tendem a explodir e gerar imensas nuvens de gás e poeira interestelar chamadas de nebulosas. Assim, as nebulosas são uma mistura de gases do tipo hidrogênio e hélio e poeira estelar formada por partículas de carbono, silício, magnésio, alumínio entre outros tipos de átomos que faziam parte da velha estrela ou que surgiram com a explosão. Com o tempo (bilhões de anos), esses gases e poeira sucumbem ao seu enorme peso e vão se concentrando cada vez mais no interior da nova estrela em formação até iniciarem violentas reações termonucleares. Ou seja, o hidrogênio submetido a uma pressão de bilhões de atmosferas terrestres se funde no interior da jovem estrela levando à formação de gás Hélio. O Hélio é um átomo que tem o dobro do tamanho do hidrogênio justamente por ser formado a partir da fusão de dois átomos de hidrogênio. Veja a sequência da evolução das estrelas na imagem abaixo.


De forma muito simplificada, a evolução das estrelas ocorre de acordo com a sequência abaixo

(período aproximado de 15 bilhões de anos)

1) Poeira Estelar - Formação de uma nuvem de poeira estelar por um período de 10 milhões de anos a partir da explosão de uma estrela muito antiga chamada de Super Nova.

2) Protoestrela – É o estágio imediatamente posterior e possui formato esférico rotacional.

3) Anã Marrom – Este estágio começa quando a temperatura de núcleo da protoestrela atinge um valor suficiente para iniciar a fusão do hidrogênio em hélio (15 milhões de graus).

4) Gigante vermelha – Após o consumo total do hidrogênio a estrela se expande e o Hélio começa ser fundido em carbono.

5) Supergigante vermelha – Nesse estágio a expansão é total e o núcleo começa a encolher tornando-se denso e gerando uma nova série de reações nucleares que culmina com a fusão de elementos mais pesados da tabela periódica como o silício e o ferro56. Nesse estágio também são formados por fusão nuclear vários outros metais pesados da tabela periódica.

6) Super Nova – Estágio avançado no qual a fusão do ferro, por vários motivos, ao invés de liberar energia passa a consumir, culminando em uma grande explosão em uma fração de segundo gerando inclusive urânio e neutrino, ou seja, poeira estelar.

A sequência apresentada não é um padrão obrigatório para a evolução das estrelas. Entretanto é fato que o envelhecimento das estrelas está relacionado com a queima do seu combustível. Por exemplo, quando todo o hidrogênio de uma estrela é "queimado" por fusão nuclear , o gás Hélio produzido se expande e a estrela muda de estágio. Neste novo momento, o combustível alternativo a ser fundido no núcleo da estrela será o Hélio. A fusão nuclear continuada do Hélio no interior da estrela gera átomos mais pesados como o carbono e assim sucessivamente até surgirem estrelas de ferro ou mais pesadas chamadas de Anãs Brancas ou Buracos Negros. Os Buracos Negros possuem imensa força gravitacional que nem a própria luz consegue escapar.

O calor intenso e a luz própria das estrelas são derivados das sucessivas fusões nucleares no seu interior liberando grande quantidade de energia térmica e eletromagnética tais como raios X, luz e vários outros tipos de radiação. Por estes motivos as protoestrelas possuem pouco brilho por não fazerem fusão nuclear.


Esquema aproximado da evolução do sol


Em Relação ao nosso sistema solar, aparentemente os planetas surgiram concomitantemente com a formação do sol. Isto significa que processos muito parecidos e derivados daqueles que deram origem ao sol foram responsáveis pela formação da Terra. No livro "Microcosmos" da Lynn Margulis e Dorion Sagan, consta que da nuvem de gases destinada a se transformar na Terra, predominavam o hidrogênio, o hélio, carbono, nitrogênio, oxigênio, ferro, alumínio, ouro, urânio, enxofre, fósforo e silício. Durante a evolução do planeta, a 4.600 milhões de anos, a mistura aleatória de gases e partículas de carbono somada a intensa atividade elétrica ambiental levou a um processo de evolução molecular que culminou com o surgimento das primeiras moléculas. O hidrogênio se combinou com o carbono para formar o metano (CH4), com o oxigênio para formar água (H2O), com nitrogênio para formar amônia (H3N) e com enxofre para formar gás sulfídrico (H2S). Posteriormente, a recombinação dessas moléculas levou ao surgimento das primeiras células vivas.

Na constelação de Orion da qual pertencem as Três Marias existe uma nebulosa que pode ser observada utilizando um telescópio simples (imagem abaixo).



Nessa imagem pode-se ver nitidamente as Três Marias que também são chamadas de Cinturão de Orion. Próximo ao cinturão encontra-se a Nebulosa de Orion que está ampliada no canto direito inferior da imagem. Lá, novos processos de formação de estrelas e sistemas planetários estão ocorrendo.

Portanto, a evolução da vida tal qual a conhecemos hoje está diretamente relacionada a evolução das estrelas porém separadas por um período de bilhões de anos. É surpreendente que a partir da fusão de simples componentes tais como partículas subatômicas e gases hidrogênio estelar tenha surgido toda diversidade de elementos químicos presentes na tabela periódica. O mais fantástico é que a partir da mistura de simples elementos químicos a vida tenha se formado e evoluído no nosso planeta de uma maneira complexa e diversificada. E é da complexidade da vida que iremos tratar a partir das próximas postagens. Portanto, quando você olhar novamente para o céu, pense que talvez esteja olhando para uma nebulosa ou para a natureza da natureza.

Abraços e até breve.

terça-feira, 30 de junho de 2009

A embriologia fractal do Mesozoico - o comportamento fractal.

Muitas pessoas não estão acostumadas com as macro escalas temporais das eras geológicas. Em qualquer situação ou em quase todas o tempo entre uma era e outra compreende um período de milhões de anos. Por exemplo, no post anterior foi sugerido que as gimnospermas apareceram primeiro que as angiospermas ao longo das eras geológicas. As eras geológicas são divisões da escala de tempo relacionadas à evolução geológica do planeta. Também são importantes para situar a idade e o surgimento das espécies vegetais e animais na terra. Assim, a evolução do planeta pode ser dividida em quatro eras, sendo elas: 1) Pré-Cambriano (4,5 bilhões até 570 milhões de anos atrás); 2) Paleozóica (545 milhões até 248 milhões de anos); 3) Mesozóica (245 milhões até 65 milhões de anos atrás) e 4) Cenozóica (65 milhões e 500 mil anos até o presente). Cada era é dividida em períodos. No quadro abaixo estão esquematizados os períodos da era mesozoica:
De acordo com este quadro, do mais antigo para o mais recente temos os períodos triássico, jurássico e cretáceo. Eu tenho especial predileção pela era mesozoica pois compreende os períodos em que floresceram e desapareceram os dinossauros. Tudo isso em mais ou menos 160 milhões de anos. 

Conforme havíamos dito, as angiospermas atuais (plantas com flores e sementes dentro de frutos) teriam surgido apenas no Cretáceo Inferior há cerca de 140 milhões de anos. Antes disso as florestas eram formadas predominantemente por cicadáceas (gimnospermas com folhas semelhantes às das palmeiras, tronco grosso mas nunca chegando à altura de uma árvore), coníferas (árvores e arbustos gimnospérmico chamados de pinheiros ou araucárias), além de pequenos pteridófitos arborescentes (samambaias). Um ambiente geral característico do jurássico é apresentado na imagem abaixo. A partir deste mundo primitivo, sem flores e frutos verdadeiros, surgiram as angiospermas (Cretáceo Inferior há cerca de 140 milhões de anos) e sua explosão de cores, formas e tamanhos. No rastro das flores e seus saborosos néctares, uma variedade enorme de insetos polinizadores em um processo de coevolução animal/vegetal jamais visto. Coincidência ou não, novas evidências fósseis, mas não moleculares, indicaram que o surgimento dos mamíferos modernos data do final do Cretáceo após a extinção dos dinossauros. Em fim, o cretáceo “é o cara”. Ou seja, a emergência dos vegetais e animais modernos tais como os conhecemos hoje. Na imagem abaixo, imaginamos uma geometria representativa da forma com que alguns vegetais ocupavam os espaços no Triássico:

  Ou seja, um mundo com vegetais pouco ramificados e imensos espaços entre eles, permitindo o deslocamento de animais de “grande porte” como no caso dos dinossauros. Com o passar das eras, este mundo se transformou e evoluiu para uma nova organização mais eficiente no seu pragmatismo em fixar carbono e crescer ocupando menos espaço, principalmente em regiões de clima temperado onde as florestas se tornaram mais densas. É o alvorecer de uma nova arquitetura natural, mais complexa e interativa. É a era das aves e pássaros e o fim dos pterossauros (répteis alados). É o surgimento da flexibilidade articular dos mamíferos frente a emergência dos espaços irregulares e profundamente curvos. É o período das ramificações emaranhadas, das redes biológicas que transformaram as florestas em uma malha interligada na qual passaram a transitar inúmeras espécies de insetos, seres alados e mamíferos de médio e pequeno porte. Nos estratos superiores das florestas, uma rede fractal interconecta por cima as copas das árvores e por baixo as raízes que também apresentam um padrão de formação autossimilar. A figura abaixo esquematiza a complexidade adquirida por estas florestas a partir do surgimento das angiospermas. O surgimento das angiospermas está relacionado com as profundas transformações ocorridas desde o período cretáceo. Entretanto, não posso afirmar que este padrão de desenvolvimento seja determinado por um gene embrião fractal que impulsione um comportamento autossimilar de crescimento e distribuição, embora tal hipótese me pareça plausível. O fato é que tanto nas monocotiledôneas quanto nas dicotiledôneas (as duas principais divisões das angiospermas), o crescimento ocorre por um tipo de brotamento no qual estruturas semelhantes (embriões fractais) aparecem como se saíssem umas de dentro das outras, semelhante à ilustração feita por Mariana Massarani exclusivamente para este blog (imagem no alto do texto). Nela, vemos indicado em uma bromélia, as futuras folhas que apresentam o mesmo aspecto geral da planta. Ufa! Por enquanto é só.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Um pouco de tudo e mais fractais

Algumas coisas ainda me deixam perplexo. Recentemente fui convidado de última hora para uma entrevista que tinha por objetivo confrontar a opinião de um cientista contra a de um teólogo a respeito da teoria da evolução. Tratava-se de uma monografia de final de curso de comunicação. Me surpreendi com a iniciativa uma vez que no próprio objetivo do projeto subtendia que “teoria da evolução” para muitos ainda era uma questão de crença baseada em opiniões próprias. Não é! Ainda estamos cometendo enormes equívocos por conta de um resquício de polêmica entre crença e conhecimento, e isto a epistemologia explica muito bem. A Teoria da Evolução é um fato sustentado por várias evidências científicas fornecidas pela paleontologia e geologia a partir de inúmeros achados fósseis e geológicos, todos devidamente datados por métodos cada vez mais sofisticados. E não para por aí! Áreas do conhecimento tais como genética, biologia molecular e anatomia comparada fornecem cada vez mais subsídios para a compreensão da evolução, algo que para cientistas e pessoas atentas não tem nada a ver com crença mas com conhecimento. O que eu estou querendo dizer? Que a ciência não pode ser contestada? Não é isso! A ciência pode e deve ser contestada pois este é um dos mecanismos do seu avanço. Entretanto, a ciência deve ser contestada com mais ciência, pois quando o conhecimento científico passa a ser encarado como uma crença irrefutável, intocável e imutável, torna-se dogmática e estabelesse-se aí as condições para o seu fracasso. É isso que se chama paradigma engessado (ver o livro pensamento sistêmico, pg. 33). O ideal é que as mudanças de paradigmas ocorram continuadamente. Vejamos um exemplo prático:

Voltando ao tema fractais
Para quem leu os últimos posts já sabe quase tudo sobre fractais. Para quem não leu fica aqui o convite para que o faça ou assista o vídeo apresentado pelo matemático espanhol Antonio Pérez Sanz. Durante a minha tese eu estava bem empolgado com o tema fractais e pedi a um aluno de iniciação científica que pesquisasse na internet algo interessante sobre esse tema. Ele me trouxe um artigo chamado “Caos e linguagem dos fractais”. Infelizmente o link que daria acesso ao artigo está corrompido, mas se você quiser saber mais sobre os autores do artigo “André Calixto Vieira” e “César de Oliveira Lopes” faça uma pesquisa na internet. Pois bem, junto com o artigo veio um conceito interessante chamado “embrião fractal”. Para Vieira e Lopes (2003), o embrião fractal é o elemento fundamental da figura, ou seja, aquele que se mostra repetitivo em qualquer escala (lembra-se do que falamos sobre autossimilaridade?). Então, se uma árvore possui ramos que se ramificam “infinitamente”, o embrião fractal, ou elemento fundamental da copa da árvore será uma imagem semelhante a uma forquilha. Concorda?

A ideia de um embrião fractal é ótima pois permite a visualização de uma estrutura fractal no tempo, isto é, dentro de um processo dinâmico de desenvolvimento e crescimento. Assim, mesmo formas da natureza que não se parecem com uma estrutura fractal podem ser classificadas como fractais por terem um comportamento fractal. Basta identificar o embrião fractal e verificar se durante o crescimento da estrutura ele aparece novamente, e assim por diante. Para exemplificar o que eu estou dizendo, vemos colocar os vegetais em termos de classificação e evolução.

Dos chamados vegetais superiores temos as Gimnospermas (plantas como as araucárias e pinheiros que possuem sementes sem frutos) e as Angiospermas (orquídeas, mangueiras, bananeiras e uma infinidade de outras plantas que possuem sementes dentro de frutos). Não se sabe ao certo se as angiospermas evoluíram das gimnospermas ou se ambas possuíram um ancestral comum (Crane 1988, Doyle et al. 1994, Price, 1996). O que se sabe é que, de acordo com os registros fósseis, o apogeu das gimnospermas ocorreu durante o baixo e médio Mesozóico (Triássico e Jurássico) e as angiospermas atuais teriam surgido apenas no Cretáceo Inferior há cerca de 140 milhões de anos . Veja a figura abaixo.

Neste momento nos interessa aprofundar o assunto apenas sobre as angiospermas. Estudaremos nas angiospermas os seus dois principais taxons (monocotiledôneas e dicotiledôneas) e as diferenças nas suas vasculaturas. Vamos fazer o seguinte, este post está ficando grande demais e não é a nossa intenção. Me comprometi em discutir a importância do conceito de embrião fractal, sua aplicação na biologia e na evolução das angiospermas e isso parece ter relação com o sistema vascular das monocotiledôneas e dicotiledôneas e outras coisas mais. Então, esperem mais uma semana, ou menos, e tudo isso ficará bem colocado. Grande abraço e até lá.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Fractais na Natureza


Fractais na Natureza


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo


ROMANHA, W. S. Fractais na natureza. 30 jun. 2009. Disponível em: < http://microsintonias.blogspot.com/2009/06/fractais-na-natureza.html>. Acesso em: 



No último post sugeri que as desordens encontradas nas interfaces entre sistemas biológicos poderiam ser entendidas utilizando o conceito de geometria fractal. Para que algo seja considerado fractal é necessário que se tenha uma propriedade fundamental denominada autossimilaridade. Apesar da ideia de fractais estar atrelada a um conceito estritamente matemático, inúmeras formas encontradas na natureza satisfazem as condições necessárias para que sejam consideradas fractais. Um bom exemplo é a copa das árvores. Em uma árvore típica, a formação da copa começa a partir das ramificações iniciais do tronco. De forma similar às primeiras ramificações, cada ramo principal sofre novas ramificações que se repetem até as ramificações terminais onde surgem as folhas. Observe o exemplo abaixo. Nesta árvore, a autossimilaridade está esquematizada ao lado.

No esquema acima, utilizando o modelo encontrado no livro de Mendelbrot (1977) e modificado por Goldberger (1987), resolví comparar uma imagem verdadeira de uma árvore sem folhas.  Ali podemos perceber os ramos “infinitos” de uma árvore. Observe que a cada vez que um dos ramos é ampliado, revela a presença de novos ramos, e assim por diante, sugerindo que o galho se ramifica por inúmeras gerações em escalas cada vez menores tendendo ao infinito. Isto é autossimilaridade! Qualquer estrutura em menor escala é similar a forma em maior escala. É como se a árvore fosse formada por milhares de pequenas árvores progressivamente menores (Mandelbrot, 1977, West & Goldberger, 1987).

Mesmo ao nível de uma folha podemos perceber a autossimilaridade tal qual observamos nos galhos da árvore. Genericamente, as folhas são divididas nas seguintes partes: bainha, pecíolo e limbo. O pecíolo surge das ramificações menores das árvores. Conforme a figura mostra, o pecíolo gera vários ramos que se ramificam posteriormente. O limbo nada mais é do que a parte verde da folha ou tecido vegetal formado por células fotossintetizantes. Assim, o pecíolo é a continuação de um sistema vascular que se origina na raiz da planta com o objetivo de transportar seiva bruta para as células da folha (o limbo). As ramificações desde o tronco até os ramos terminais dos pecíolos reproduzem um padrão também observado no sistema vascular dos mamíferos. Ou seja, as ramificações terminais dos pecíolos equivalem aos capilares sanguíneos que se originam das arteríolas do nosso corpo e nutrem as células na intimidade dos tecidos; ou as ramificações terminais da árvore brônquica (bronquíolos do pulmão) que ao nível dos sacos alveolares realizam as troas gasosas. Tanto as ramificações dos pecíolos dos vegetais quanto os capilares sanguíneos e os bronquíolos são pequenos e finos o suficiente para interagirem diretamente com as células de cada tecido correspondente, e todos eles reproduzem um padrão fractal.

Quando as folhas das árvores caem no solo de uma floresta úmida o limbo é a primeira estrutura a ser decomposta pelos microrganismos presentes. Como resultado, sobra apenas o esqueleto da folha formado pelas ramificações do pecíolo que pode ser encontrado no chão da floresta.

Assim, conforme demonstramos, o esqueleto da folha apresenta uma estrutura autossimilar que satisfaz todas as condições de uma estrutura fractal.

Então, como primeira conclusão, o estudo das formas fractais presentes na natureza corresponde a um tipo de geometria da natureza. Entretanto, é uma geometria que não tem nada a ver com as formas que estamos habitualmente acostumados tais como esferas, polígonos ou mesmo os sólidos platônicos (figura abaixo) que a partir dos quais Platão procurou explicar o universo.


Platão buscou nos sólidos regulares a explicação para a origem do universo. Da esquerda para a direita temos: octaedro, icosaedro, cubo (ou hexaedro), tetraedro e um dodecaedro.

Do ponto de vista do pensamento matemático antigo, alguns estudiosos importantes como Galileu e Descartes foram obcecados por encontrar nos resultados de suas pesquisas figuras geométricas ditas perfeitas como a parábola, a elipse e o círculo. Acreditavam que a natureza não tinha muita escolha na formalização dos seus fenômenos que não os traçados bem comportados descritos por Euclides (Revisado em Ricieri, A. P., 1990). Hoje, sabe-se que as formas da natureza não obedecem apenas a lógica da geometria clássica ou Euclidiana. O matemático Francês Benoit Mandelbrot, um dos pais da geometria fractal, havia percebido isto muito antes de 1983 quando declarou o seguinte no seu livro A Geometria Fractal da Natureza: “nuvens não são esferas, montanhas não são cones, linhas costeiras não são círculos, cascas de árvores não são suaves e nem o raio se propaga em linha reta”.


"Formas da natureza que não obedecem as leis matemáticas da geometria clássica ou Euclidiana"

Essas afirmações deixam claro que as formas ou a geometria da natureza respeitam outras leis geométricas. Estas não são definidas apenas pelas dimensões tradicionais, ou seja, a primeira (a reta), segunda (o quadrado) e terceira dimensões (o cubo), mas também pela dimensão dos fractais na qual a autossimilaridade é a principal propriedade (mas não a única).

Qual é a importância dos fractais em biologia? Segundo um cientista chamado Cross (1994), a dimensão fractal pode ser entendida como uma medida de complexidade. De fato, a função de vários órgãos do corpo dos mamíferos bem como a atividade das plantas está relacionada diretamente com a forma adquirida por eles ao longo da evolução. Nós aprendemos nos primeiro e segundo graus que as células do intestino possuem vilosidades e que estas por sua vez possuem microvilosidades. A análise dessas vilosidades mostrou que elas possuem um padrão fractal (microvilosidades que surgem de vilosidades, que surgem de dobras intestinais e que por sua vez surgem das alças curvas intestinas, e assim por diante). A disposição das microvilosidades intestinais potencializa o nível de absorção de nutrientes para o interior da célula devido ao aumento da área ou superfície de contato com os alimentos. Isto só ocorre porque a estrutura é fractal.

O mesmo acontece com as árvores. A disposição fractal da copa das árvores potencializa e maximiza a exposição de uma quantidade enorme de folhas ao sol, permitindo maior eficiência na captação de luz. A disposição fractal das árvores adultas também permite que elas lancem novos ramos durante todo o ano sem que o aumento do perímetro da copa seja perceptível. Então, uma estrutura fractal fornece o máximo de eficiência com o mínimo de ocupação de espaço. Veja o caso dos vasos sanguíneos dos animais.

No caso dos vasos sanguíneos, a natureza de suas ramificações é fractal e como tal tende a um crescimento infinito. Assim, apesar do sangue ocupar pouco espaço, não mais do que 5% do corpo, na maioria dos tecidos nenhuma célula está a uma distância de mais de três ou quatro células de um vaso sanguíneo (Gleick, 1989).

Para concluir, a propriedade fractal da uma determinada vegetação é determinante para o tipo de fauna existente ali. Quanto mais complexa a trama verde de uma floresta, mais favorável será para a presença de pequenos artrópodes e assim por diante. Se você quiser saber mais sobre fractais veja o seguinte site: http://math.rice.edu/~lanius/frac/ ou baixe o programa WINFRACT para windows e divirta-se.

Grande abraço e até a próxima.
 
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