sábado, 6 de janeiro de 2024

Políticas Públicas de Saúde (Capítulo 2/3): A Saúde na Era Vargas.

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Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo.

ROMANHA, Waldemiro de Souza. A Era Vargas. In: ROMANHA, Waldemiro de Souza. Políticas Públicas de Saúde. Rio de Janeiro: UVA, 2021. p. 38 – 44. E-book: ISBN 978-65-5700-108-0.   Disponível em: https://www.blogger.com/blog/post/edit/preview/8502128735235054609/1764432953092209679


A saúde na era Vargas


Finalmente chegamos aos anos trinta, o início do assim chamado Governo Provisório por ter sido derivado de um Golpe de Estado liderado por Getúlio Vargas. Vargas foi candidato nas eleições de 1930, mas sabia que não tinha condições de romper com as forças que se revezavam no poder por praticamente 40 anos, principalmente após o assassinato do seu vice João Pessoa.

Portanto, Vargas organizou um golpe de estado com o apoio dos industriais urbanos, da classe média operária e das elites intelectuais e artísticas da época, instaurando um governo provisório por quatro anos (1930 - 1934). Uma de suas primeiras medidas foi o fechamento do congresso seguido da destituição dos governadores. No lugar deles foram colocados interventores. Tal medida desmontou o poder das oligarquias mineiras e paulistas que se revezavam no governo central através de fraudes eleitorais a partir do que se denominou política do café com leite.

 O movimento sanitário foi severamente comprometido com o fim da República Velha.

Vamos lembrar que, no contexto do movimento sanitário, as políticas públicas de saúde eram viabilizadas sempre que os interesses das oligarquias convergiam com os interesses dos sanitaristas. Os sanitaristas tinham uma ideologia consistente que pregava o combate às doenças a partir de uma abordagem profilática ou preventiva. Era necessário que o sanitarismo se tornasse parte da consciência nacional a partir de programas de educação e saúde. A convergência com os interesses oligárquicos era ampla, pois, segundo a lógica dos ruralistas, um ambiente saneado era igual a trabalhadores saudáveis e aumento de exportação. Mas não ia muito além disso! Tal acerto era limitado por um paradoxo capitalista: a contraposição entre saúde e educação. 1. Saúde gera força de trabalho; 2. Educação gera mobilização e luta de classes por direitos. Portanto, a resolução desta dualidade nem sempre interessava, e era neste limite que as convergências se tornavam incongruentes.

O panorama econômico ao final da República Velha era de oligarquias enfraquecidas devido ao fracasso de seu modelo agroexportador. Com isso, quebrou-se a hegemonia dos grupos ligados ao café e a pecuária, cedendo lugar para outros grupos sociais tais como industriais voltados para o mercado interno e aumento do capital. Portanto, a economia se deslocou do polo rural para o polo urbano e o movimento sanitarista praticamente desapareceu (NETO, 2011).

O governo de Vargas adotou uma política de saúde urbana com base em critérios econômicos harmonizados com as forças que o impulsionaram rumo ao governo central. Não se combatia mais a doença, mas sim os surtos epidêmicos de acordo com a conveniência do capital. Como exemplo pode-se citar o surgimento da Estatal Vale do Rio Doce (1941) cujo objetivo era explorar as minas de Itabira (MG). Tal empreitada exigia o saneamento da área a ser explorada, e, para isso, em 1942, Vargas determinou que o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) realizasse o saneamento da região.

Sodados da borracha. Brasileiros recrutados durante a guerra para suprir os Estados Unidos com borracha para sua indústria bélica. Mais de 10.000 foram mortos por malária, índios e animais. Os sobreviventes foram abandonados pelo governo Vargas sem indenização. 

No mesmo ano, o SESP desenvolveu atividades de saneamento em áreas de importância estratégica na Amazônia em função do interesse momentâneo que a guerra (segunda guerra mundial) criara pela borracha (SANTOS, 1985).

Portanto, a partir da Revolução de 1930, a saúde se converteu predominantemente ao modelo assistencialista. O objetivo das elites era manter a força de trabalho em condições satisfatórias de produção, e por isso se valiam cada vez mais da assistência médica vinculada à Previdência Social (CAPs).

Cabe considerar que o movimento sanitarista desde a sua origem esteve atrelado ao Estado, e teve como fundamento administrativo a centralização das suas ações que se caracterizavam por posturas tipicamente autoritárias e verticalizadas. Era de se esperar que uma conjuntura militarista, nacionalista e autoritária representasse um ambiente propício para o seu desenvolvimento. Entretanto, o que se viu foi o seu esfacelamento. Uma possível aproximação que ilumine essa aparente contradição talvez esteja na criação do Ministério da Educação e Saúde em 1930. Esta, uma antiga reivindicação da classe higienista em substituição ao DGSP (Diretoria-Geral da Saúde Pública) acabou se mostrando o seu maior obstáculo. Apesar de a educação e a saúde estarem atreladas ao novo ministério, suas ações se restringiram a produção de um amontoado de folhetos explicativos e cartilhas inatingíveis para uma população formada por mais de 60% de analfabetos e analfabetos funcionais. Para piorar, em 1931, Vargas, por decreto presidencial, extinguiu os centros de saúde, iniciando um processo de centralização administrativa que perdurou por mais de uma década.

A criação do Ministério da Educação e Saúde se converteu em uma gestão altamente burocratizada com força o suficiente para gerar uma paralisação no processo político do movimento sanitarista. Vale lembrar que o início do movimento foi acompanhado por uma mobilização política que o empurrou rumo ao interior do país como uma condição para o aperfeiçoamento da identidade nacional. A despolitização do movimento acabou com o seu potencial de transformação no campo, enfraquecendo o enfrentamento ao poder das oligarquias rurais em direção a uma ação de Educação em Saúde dentro das fazendas. Por motivos óbvios, não interessava aos coronéis dos latifúndios tamanho grau de organização popular no interior de suas fronteiras. Assim, as políticas públicas de saúde foram deslocadas para os grandes centros urbanos em resposta às pressões sindicais.

Em 1933, Vargas deu continuidade à consolidação de uma medicina assistencialista estatizando definitivamente os CAPs e transformando-os em Instituto de Aposentadoria e Pensão (IAP). Neste contexto, sua gestão passou para o controle do Estado, dando início a uma das principais problemáticas observadas até hoje quando se fala em previdência e assistência social: o desvio de finalidade. Enquanto os CAPs tinham como diretrizes básicas a assistência médica por meio de uma rede própria desenvolvida para este fim, os IAPs priorizavam a contenção de gastos como uma política de acumulação visando sua utilização em outras áreas de interesse do governo.

Assim, o sistema de saúde, composto pelo Ministério da Educação e Saúde entrou em uma fase de subfinanciamento cujas provisões de serviço advinham dos IAPs que eram vinculados ao Ministério do Trabalho. Cada IAP estava atrelado não mais a empresas como os CAPs, mas a categorias profissionais como a dos Marítimos (IAPM), Bancários (IAPB), comerciantes (IAPC) e Industriários (IAPI), cada uma com diferentes serviços e níveis de cobertura. O programa era fragmentado e desigual. Trabalhadores com empregos esporádicos tinham como opção os serviços filantrópicos ou a medicina liberal privada e paga. A maioria da população não tinha nenhum direito (PAIM, et al., 2011). 

O governo provisório terminou em 1934 apesar de Vargas ter continuado como presidente por muitos anos.


Bibliografia

1. Castro, S. L. A. O pensamento sanitarista na primeira república: Uma ideologia de construção da nacionalidade. Revista de Ciências Sociais. 28(2):123-210, 1985. Biblioteca Virtual em Saúde (bvsalud.org)

2. Nunes, E. D. Sobre a história da saúde pública: ideias e autores. Ciência e Saúde Coletiva. 5(2): 251-264,  2000. https://www.scielo.br/pdf/csc/v5n2/7095.pdf

3. Junior, A. G. S. & Alves, C. A. Modelos Assistenciais em Saúde: desafios e perspectivas. In: Marosini M. V. G. C. & Corbo, A. D. Educação Profissional e Docência em Saúde: a formação e o trabalho do agente comunitário de saúde. Rio de Janeiro (RJ): FIOCRUZ; 2011.

4. Paim, J.; Travassos, C.; Almeida, C.; Bahia, L.; Macinko, J. O Sistema de Saúde Brasileiro: história, avanços e desafios. The Lancet. 6735(11): 60054-8, 2011.

5. Aguiar, Z. N. Antecedentes históricos do Sistema Único de Saúde (SUS): breve história da política de saúde no Brasil. In: Aguiar, Z. N. SUS Sistema Único de Saúde: antecedentes, percurso, perspectivas e desafios. São Paulo (SP): Martinari, 2011.

6. Cohn, A. O estudo das políticas de saúde: implicações e fatos. In: Campos, W. G. S.; et. alTratado de saúde coletiva. São Paulo (SP): Hucitec, 2006.

 

Midiateca

Mídia 1

Guerras no Brasil: A Revolução de 1930.

Descrição:

Contextualização histórica do Brasil pré e pós-revolução de 30.

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=cH5HPE11qg4

 

Mídia 2

Lei Eloy Chaves: Cria as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs)

Descrição:

Palestra sobre as CAPs instituída pela Lei Eloy Chaves. Primeiro ato de previdência social no Brasil.

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=5BRa1GvlSqM

 

Mídia 3

Políticas públicas de saúde: Sistema Único de Saúde

Descrição:

Linha do tempo dinâmica com todas as políticas públicas de saúde desde 1923 até 2006.

Fonte:

https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/esf/2/unidades_conteudos/unidade04/p_01.htm#sample2

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