sábado, 6 de janeiro de 2024

Capítulo 2/2: O Avanço das Políticas Públicas.


O avanço das políticas públicas


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo.

ROMANHA, Waldemiro de Souza. A Era Vargas. In: ROMANHA, Waldemiro de Souza. Políticas Públicas de Saúde. Rio de Janeiro: UVA, 2021. p. 38 – 44.  Disponível em: 


Aos poucos o sanitarismo rural foi se convertendo na nova bandeira da saúde pública do Brasil até se transformar em uma aspiração nacional. Ou seja, o movimento sanitarista foi superando a sua fase urbana e se convertendo ao “saneamento dos sertões”.

Um dos principais motivos desta guinada foi a publicação em 1916 do Relatório Neiva-Penna, como resultado da primeira expedição científica organizada pelo Instituto Oswaldo Cruz em 1912. Nela, os médicos sanitaristas Artur Neiva e Belisário Pena percorreram durante vários meses o norte e o nordeste da Bahia, o sudeste de Pernambuco, o sul do Piauí e o norte e sul de Goiás, em busca de respostas para os graves quadros epidêmicos e suas causas.

No relatório, os sanitaristas denunciaram as péssimas condições de vida no interior do país. Eles apontaram que a saúde das populações que viviam às margens do Rio São Francisco era tão ruim quanto a saúde das populações que viviam no semiárido, derrubando as teses oligárquicas que diziam que as condições de saúde e pobreza do nordeste estavam relacionadas ao clima semiárido. Tais teses não se sustentavam pois as expedições de Penna e Neiva mostraram que as populações às margens do Rio São Francisco estavam sujeitas a um clima diverso e mesmo assim apresentavam os mesmos quadros epidêmicos gerais com diferenças pontuais. Como medida de emergência eles propuseram  a criação de um serviço médico itinerante para toda a região visando à melhora das condições de saúde. Posteriormente, Belisário Penna apresentou um conjunto de medidas para ser aplicado imediatamente: 

  • Intervenção crescente do Estado no setor da saúde pública; 
  • Elaboração de novo código sanitário para todo o país; 
  • Divisão do Brasil em oito zonas sanitárias; 
  • Criação de tribunal federal especial para tratar de questões decorrentes da aplicação da     nova legislação; 
  • Seleção de uma endemia em dois municípios de cada Estado durante a fase inicial de saneamento do país.

Belisário Penna e seus colegas criaram a Liga Pró Saneamento do Brasil para pressionar o Governo a implementar o programa. Como resultado, o presidente Venceslau Brás (1914 – 1918), em seu último ano de governo, criou o Serviço de Profilaxia Rural, centralizando as ações de saúde pública que seriam aplicadas no interior. As ações visavam intervenções no nordeste para combater a malária, o amarelão e a doença de Chagas (Nunes, 2000).

Entretanto, os avanços mais consistentes vieram mesmo no governo de Epitácio Pessoa (1919 – 1922) com a ampliação dos projetos de intervenção estatal a partir das seguintes mudanças: 

  • Carlos Chagas assume a Coordenação do Departamento Nacional de Saúde Pública, cargo que ficou vago desde Oswaldo Cruz. 
  • Belisário Penna assume a direção dos Serviços e Saneamento Rural que passa a ser gerido com recursos dos impostos federais sobre bebidas alcoólicas, produtos farmacêuticos e casas de jogo.

Estas mudanças permitiram que o conjunto de medidas propostas por Belisário Penna se tornasse viável e consolidasse o sanitarismo rural como a principal bandeira da saúde púbica no Brasil. Cabe ressaltar que o sanitarismo urbano, com suas concepções higienistas de cunho eugênico, não desapareceu. Ele perdurou como uma herança fascista dos ideais eugênicos de Plínio Salgado e companhia. Entretanto, é possível afirmar que parte do Sanitarismo Urbano foi inadvertidamente absorvido pelo Sanitarismo Rural, no sentido de que as ações sanitárias de Oswaldo Cruz, voltadas primariamente para os ambientes urbanos, lançaram as bases do sanitarismo campanhista, amplamente utilizado pelo sanitarismo rural. Neste sentido, Oswaldo Cruz foi o pai do sanitarismo rural, haja visto que a expedição Belisário Pena e Artur Neiva se deu em plena vigência da sua gestão como presidente do IOC. 

Por outro lado, as reivindicações justas da classe média trabalhadora nos centros urbanos por melhores condições de salário, trabalho, assistência médica e aposentadoria, impulsionaram uma nova categoria de medicina, mais liberal, voltada para o mercantilismo médico e privatista, vinculada às Caixas de Pensão e Aposentadoria (CAPs). Esta nova categoria seguiu uma linha independente do movimento sanitarista. Portanto, as políticas públicas de saúde no Brasil seguiram duas linhas independentes.

  • Na primeira linha encontrava-se o  modelo CAPs associado a uma abordagem individual de saúde, medicalizante e hospitalocêntrica, onde os determinantes sociais (condições de vida) eram desconsiderados como fatores que também afetavam a saúde dos indivíduos e da coletividade.
  • Na segunda linha estava o ideário sanitarista, que preconizava o resgate sanitário das populações esquecidas do semiárido nordestino como parte de uma reconstrução nacional de identidade. Este resgate deveria ocorrer a partir de uma intervenção governista, visando uma mudança de mentalidade das populações trabalhadoras rurais, incluindo os grandes proprietários de terra que ainda nutriam uma relação quase que escravista com os trabalhadores do campo. Portanto, na construção de uma nova identidade nacional não cabia a cultura dos “coronéis” e nem a imagem do homem do campo como um “jeca”.

A estrutura organizacional da saúde no Brasil começava a se delinear de forma dicotômica. Nos grandes centros urbanos as ações de atenção à saúde seguiam uma lógica de assistência médica equivalente a um modelo curativo/privatista. Sua gestão estava subordinada a um sistema de previdência social rudimentar denominado CAPs cujo financiamento era bipartite (empregados e empregadores), ou seja, a sua origem era contributiva (Cohn, 2006). Nas zonas rurais do interior do Brasil, o modelo de gestão de saúde era o sanitarismo campanhismo surgido no início do século XX e que se ocupava de ações higienistas voltadas para a erradicação das grandes endemias nacionais. Este modelo tinha um caráter investigativo e científico e estava subordinado ao Departamento Nacional de Saúde Pública (Júnior & Alves, 2007).

Do ponto de vista das caixas de pensão (assistência médica), o modelo era completamente excludente, pois contemplava apenas aqueles que estavam vinculados a alguma empresa que estivesse obrigada por lei a garantir os direitos recém conquistados pelos trabalhadores. As pessoas sem vínculo empregatício, ou teriam de pagar do próprio bolso, o que seria inviável caso não pertencessem às classes privilegiadas, ou deveriam procurar hospitais filantrópicos. Cabe ressaltar que durante três séculos de colonização, existiam apenas dez Santas Casas de Misericórdia no Brasil. Ou seja, apesar da Lei Eloy Chaves de 1923, a situação foi de total catástrofe assistencial durante toda a década de 1920.

Santa Casa de Misericórdia de Manaus (1853 - 2004).

Além disso, neste período o Brasil viveu uma crise macroeconômica sem precedentes. Tratava-se da crise europeia após a primeira guerra mundial (1918). Os países europeus passaram a investir no seu próprio mercado comprometendo a exportação do nosso principal produto: o café. Essa nova política econômica representou a primeira grande ameaça ao sanitarismo brasileiro e ao seu nacionalismo ideológico, que aspirava construir uma consciência sanitarista calcada na educação e no saneamento do Brasil, mas que precisava cada vez mais de intervenção estatal como forma de organização e financiamento

Apesar da crescente falta de recurso devido a crise, o novo código sanitário de 1920 intensificou o nível de intervenção Federal no interior de Brasil a partir da criação de postos de profilaxia em 11 estados da região nordeste. Em 1922, este número chegou perto de 100. Durante a presidência de Artur Bernardes (1922 – 1926) o nível de intervenção governamental aumentou com as campanhas de higiene infantil e antituberculose na Bahia. No período de Washington Luís (1927 – 1929), o modelo campanhista ainda sustentava algum fôlego com as campanhas de Educação em Saúde de Belisário Pena pelos Estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e vários Estados do Nordeste, voltadas para o despertar da consciência sanitária do povo (expressão da época). Apesar disso, alguns postos de profilaxia rural foram fechados por falta de recursos, e progressivamente o movimento sanitário foi se esvaziando (SANTOS, 1985).

A crise se agravou com a quebra da Bolsa de Nova York gerando uma forte recessão no mundo ocidental. O desemprego, a inflação, as greves por melhores condições de saúde e trabalho, entre outros, levaram ao golpe de estado dado por Getúlio Vargas (24/10/1929) que depôs o então presidente Washington Luís e impediu a posse do presidente eleito Júlio Prestes. Estava terminada a República Velha e iniciado o período militar. Com as mudanças, vieram novas perspectivas para a saúde e para as relações entre trabalhadores e patrões, tanto para o bem quanto para o mal.

Continua...

Bibliografia

1. Castro, S. L. A. O pensamento sanitarista na primeira república: Uma ideologia de construção da nacionalidade. Revista de Ciências Sociais. 28(2):123-210, 1985. Biblioteca Virtual em Saúde (bvsalud.org)

2. Nunes, E. D. Sobre a história da saúde pública: ideias e autores. Ciência e Saúde Coletiva. 5(2): 251-264,  2000. https://www.scielo.br/pdf/csc/v5n2/7095.pdf

3. Junior, A. G. S. & Alves, C. A. Modelos Assistenciais em Saúde: desafios e perspectivas. In: Marosini M. V. G. C. & Corbo, A. D. Educação Profissional e Docência em Saúde: a formação e o trabalho do agente comunitário de saúde. Rio de Janeiro (RJ): FIOCRUZ; 2011.

4. Paim, J.; Travassos, C.; Almeida, C.; Bahia, L.; Macinko, J. O Sistema de Saúde Brasileiro: história, avanços e desafios. The Lancet. 6735(11): 60054-8, 2011.

5. Aguiar, Z. N. Antecedentes históricos do Sistema Único de Saúde (SUS): breve história da política de saúde no Brasil. In: Aguiar, Z. N. SUS Sistema Único de Saúde: antecedentes, percurso, perspectivas e desafios. São Paulo (SP): Martinari, 2011.

6. Cohn, A. O estudo das políticas de saúde: implicações e fatos. In: Campos, W. G. S.; et. alTratado de saúde coletiva. São Paulo (SP): Hucitec, 2006.

 

Midiateca

Mídia 1

Guerras no Brasil: A Revolução de 1930.

Descrição:

Contextualização histórica do Brasil pré e pós-revolução de 30.

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=cH5HPE11qg4

 

Mídia 2

Lei Eloy Chaves: Cria as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs)

Descrição:

Palestra sobre as CAPs instituída pela Lei Eloy Chaves. Primeiro ato de previdência social no Brasil.

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=5BRa1GvlSqM

 

Mídia 3

Políticas públicas de saúde: Sistema Único de Saúde

Descrição:

Linha do tempo dinâmica com todas as políticas públicas de saúde desde 1923 até 2006.

Fonte:

https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/esf/2/unidades_conteudos/unidade04/p_01.htm#sample2

Capítulo 2/3: A Saúde na Era Vargas.




 

A saúde na era Vargas


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo.

ROMANHA, Waldemiro de Souza. A Era Vargas. In: ROMANHA, Waldemiro de Souza. Políticas Públicas de Saúde. Rio de Janeiro: UVA, 2021. p. 38 –  44.Disponível em: 


Finalmente chegamos aos anos trinta, o início do assim chamado Governo Provisório por ter sido derivado de um Golpe de Estado liderado por Getúlio Vargas.

Fig. 1. Notícia sobre o assassinato de João Pessoa.

Vargas foi candidato nas eleições de 1930, mas sabia que não tinha condições de romper com as forças que se revezavam no poder por praticamente 40 anos, principalmente após o assassinato do seu vice João Pessoa (fig. 1). Portanto, Vargas organizou um golpe de estado com o apoio dos industriais urbanos, da classe média operária e das elites intelectuais e artísticas da época, instaurando um governo provisório por quatro anos (1930 - 1934). Uma de suas primeiras medidas foi o fechamento do congresso seguido da destituição dos governadores. No lugar deles foram colocados interventores. Tal medida desmontou o poder das oligarquias mineiras e paulistas que se revezavam no governo central através de fraudes eleitorais a partir do que se denominou política do café com leite.

 O movimento sanitário foi severamente comprometido com o fim da República Velha.

Vamos lembrar que, no contexto do movimento sanitário, as políticas públicas de saúde eram viabilizadas sempre que os interesses das oligarquias convergiam com os interesses dos sanitaristas. Os sanitaristas tinham uma ideologia consistente que pregava o combate às doenças através de uma abordagem profilática ou preventiva. Era necessário que o sanitarismo se tornasse parte da consciência nacional a partir de programas de educação em saúde. A convergência com os interesses oligárquicos era ampla, pois, segundo a lógica dos ruralistas, um ambiente saneado era igual a trabalhadores saudáveis e aumento de exportação. Mas não ia muito além disso! Tal acerto era limitado por um paradoxo capitalista: a contraposição entre saúde e educação. 1. Saúde gera força de trabalho; 2. Educação gera mobilização e luta de classes por direitos. Portanto, a resolução desta dualidade nem sempre interessava, e era neste limite que as convergências se tornavam incongruentes.

O panorama econômico ao final da República Velha era de oligarquias enfraquecidas devido ao fracasso de seu modelo agroexportador. Com isso, quebrou-se a hegemonia dos grupos ligados ao café e a pecuária, cedendo lugar para outros grupos sociais tais como industriais voltados para o mercado interno e aumento de capital. Portanto, a economia se deslocou do polo rural para o polo urbano e o movimento sanitarista praticamente desapareceu (NETO, 2011).

O governo de Vargas adotou uma política de saúde urbana com base em critérios econômicos harmonizados com as forças que o impulsionaram rumo ao governo central. Não se combatia mais a doença, mas sim os surtos epidêmicos de acordo com a conveniência do capital. Como exemplo, pode-se citar o surgimento da Estatal Vale do Rio Doce (1941) cujo objetivo era explorar as minas de Itabira (MG). Tal empreitada exigia o saneamento da área a ser explorada, e para isso, em 1942, Vargas determinou que o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) realizasse o saneamento da região.

No mesmo ano, o SESP desenvolveu atividades de saneamento em áreas de importância estratégica na Amazônia em função do interesse momentâneo que a guerra (segunda guerra mundial) criara pela borracha (SANTOS, 1985) (fig.2).


Fig. 2; Sodados da borracha. Brasileiros recrutados durante a guerra para suprir os Estados Unidos com borracha para sua indústria bélica. Mais de 10.000 foram mortos por malária, índios e animais. Os sobreviventes foram abandonados pelo governo Vargas sem indenização. 

Portanto, a partir da Revolução de 1930, a saúde se converteu predominantemente ao modelo assistencialista. O objetivo das elites era manter a força de trabalho em condições satisfatórias de produção, e por isso se valiam cada vez mais da assistência médica vinculada à Previdência Social (CAPs).

Cabe considerar que o movimento sanitarista desde a sua origem esteve atrelado ao Estado, e teve como fundamento administrativo a centralização das suas ações que se caracterizavam por posturas tipicamente autoritárias e verticalizadas. Era de se esperar que uma conjuntura militarista, nacionalista e autoritária representasse um ambiente propício para o seu desenvolvimento. Entretanto, o que se viu foi o seu esfacelamento. Uma possível aproximação que ilumine essa aparente contradição talvez esteja na criação do Ministério da Educação e Saúde em 1930. Esta, uma antiga reivindicação da classe higienista em substituição ao DGSP (Diretoria-Geral da Saúde Pública) acabou se mostrando o seu maior obstáculo. Apesar de a educação e a saúde estarem atreladas ao novo ministério, suas ações se restringiram à produção de um amontoado de folhetos explicativos e cartilhas inatingíveis para uma população formada por mais de 60% de analfabetos e analfabetos funcionais. Para piorar, em 1931 Vargas extinguiu por decreto os centros de saúde, iniciando um processo de centralização administrativa que perdurou por mais de uma década.

A criação do Ministério da Educação e Saúde se converteu em uma gestão altamente burocratizada com força o suficiente para gerar uma paralisação no processo político do movimento sanitarista. Vale lembrar que o início do movimento foi acompanhado por uma mobilização política que o empurrou rumo ao interior do país como uma condição para o aperfeiçoamento da identidade nacional. A despolitização do movimento acabou com o seu potencial de transformação no campo, enfraquecendo o enfrentamento ao poder das oligarquias rurais em direção a uma ação de educação para a saúde dentro das fazendas. Por motivos óbvios, não interessava aos coronéis dos latifúndios tamanho grau de organização popular no interior de suas fronteiras. Assim, as políticas públicas de saúde foram deslocadas para os grandes centros urbanos em resposta às pressões sindicais.

Em 1933, Vargas deu continuidade à consolidação de uma medicina assistencialista estatizando definitivamente os CAPs e transformando-os em Instituto de Aposentadoria e Pensão (IAP). Neste contexto, sua gestão passou para o controle do Estado, dando início a uma das principais problemáticas observadas até hoje quando se fala em previdência e assistência social: o desvio de finalidade. Enquanto os CAPs tinham como diretrizes básicas a assistência médica por meio de uma rede própria desenvolvida para este fim, os IAPs priorizavam a contenção de gastos como uma política de acumulação visando sua utilização em outras áreas de interesse do governo.

Assim, o sistema de saúde, composto pelo Ministério da Educação e Saúde, entrou em uma fase de subfinanciamento cujas provisões de serviço advinham dos IAPs que eram vinculados ao Ministério do Trabalho. Cada IAP estava atrelado não mais a empresas como os CAPs, mas a categorias profissionais como a dos Marítimos (IAPM), Bancários (IAPB), comerciantes (IAPC) e Industriários (IAPI), cada uma com diferentes serviços e níveis de cobertura. O programa era fragmentado e desigual. Trabalhadores com empregos esporádicos tinham como opção os serviços filantrópicos ou a medicina liberal privada e paga. A maioria da população não tinha nenhum direito (PAIM, et al., 2011). 

O governo provisório terminou em 1934 apesar de Vargas ter continuado como presidente por muitos anos.


Continua...


Bibliografia

1. Castro, S. L. A. O pensamento sanitarista na primeira república: Uma ideologia de construção da nacionalidade. Revista de Ciências Sociais. 28(2):123-210, 1985. Biblioteca Virtual em Saúde (bvsalud.org)

2. Nunes, E. D. Sobre a história da saúde pública: ideias e autores. Ciência e Saúde Coletiva. 5(2): 251-264,  2000. https://www.scielo.br/pdf/csc/v5n2/7095.pdf

3. Junior, A. G. S. & Alves, C. A. Modelos Assistenciais em Saúde: desafios e perspectivas. In: Marosini M. V. G. C. & Corbo, A. D. Educação Profissional e Docência em Saúde: a formação e o trabalho do agente comunitário de saúde. Rio de Janeiro (RJ): FIOCRUZ; 2011.

4. Paim, J.; Travassos, C.; Almeida, C.; Bahia, L.; Macinko, J. O Sistema de Saúde Brasileiro: história, avanços e desafios. The Lancet. 6735(11): 60054-8, 2011.

5. Aguiar, Z. N. Antecedentes históricos do Sistema Único de Saúde (SUS): breve história da política de saúde no Brasil. In: Aguiar, Z. N. SUS Sistema Único de Saúde: antecedentes, percurso, perspectivas e desafios. São Paulo (SP): Martinari, 2011.

6. Cohn, A. O estudo das políticas de saúde: implicações e fatos. In: Campos, W. G. S.; et. alTratado de saúde coletiva. São Paulo (SP): Hucitec, 2006.

 

Midiateca

Mídia 1

Guerras no Brasil: A Revolução de 1930.

Descrição:

Contextualização histórica do Brasil pré e pós-revolução de 30.

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=cH5HPE11qg4

 

Mídia 2

Lei Eloy Chaves: Cria as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs)

Descrição:

Palestra sobre as CAPs instituída pela Lei Eloy Chaves. Primeiro ato de previdência social no Brasil.

Fonte:

https://www.youtube.com/watch?v=5BRa1GvlSqM

 

Mídia 3

Políticas públicas de saúde: Sistema Único de Saúde

Descrição:

Linha do tempo dinâmica com todas as políticas públicas de saúde desde 1923 até 2006.

Fonte:

https://www.unasus.unifesp.br/biblioteca_virtual/esf/2/unidades_conteudos/unidade04/p_01.htm#sample2

Capítulo 3/1: A burocracia Crescente da Era Vargas.


A burocracia Crescente da Era Vargas


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo.

ROMANHA, Waldemiro de Souza. A criação do Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP) e a reforma administrativa de Vargas. In: ROMANHA, Waldemiro de Souza. Políticas Públicas de Saúde. Rio de Janeiro: UVA, 2021. p. 45 – 60. Disponível em: 

Introdução

A saúde no Brasil evoluiu a partir de duas vias: A  primeira estava relacionada a um ideário sanitarista de saúde pública gratuita e acessível para toda a população e cuja representação era o Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP), criado em 1930. A segunda se desenvolveu no contexto da medicina assistencial previdenciária, atrelada às políticas partidárias do então Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC). A Era Vargas foi marcada pela indefinição quanto ao tipo de política de saúde a ser seguida. Se por um lado o sistema previdenciário favorecia as empresas privadas, por outro, os segurados deste mesmo sistema sofriam com atendimentos desumanizados e assistência médica precarizada. A unificação das Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) em Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs) apenas agravou o problema e agregou outros novos. A centralização dos recursos nas mãos do governo fez com que a saúde pública ficasse subfinanciada devido ao desvio de finalidade das verbas públicas. Neste contexto ocorreu a reforma do MESP como resposta a estas distorções. O resultado de todo esse processo foi o esvaziamento do movimento sanitarista que se ressentiu com a falta de verba e de apoio governamental. Só bem depois da era Vargas é que foram realizadas reformas mais robustas, tal como a criação do INAMPS, que junto com os movimentos pela Reforma Sanitária e Psiquiátrica deram contornos para uma política de saúde mais racional e eficiente. Boa leitura!

A burocracia crescente da era Vargas

Nos capítulos anteriores ficou claro que o desenvolvimento das políticas públicas de saúde, no contexto sanitarista, e suas bifurcações baseadas em demandadas específicas e subjetivas, não morreram completamente. O aparente fracasso do movimento sanitarista atribuído à máquina burocrática do Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP), criado em 1930, foi responsável pela desmobilização política do movimento e, consequentemente, pelo seu esvaziamento. Entretanto, na atualidade é possível verificar vários indícios de que a semente do sanitarismo outrora plantada germinou, e mesmo desidratada, os remanescentes de suas raízes favoreceram o seu ressurgimento. Por exemplo: Em qualquer localidade do território nacional houve-se falar em vacinas. As mães estão sempre preocupadas com a carteirinha do SUS e as datas em que seus filhos deverão ser vacinados (fig. 1). 

Fig. 1. Carteirinha de vacinação.

As campanhas são amplas e o serviço público é completamente gratuito para quem se utiliza dele. Se por um lado o movimento sanitarista conseguiu, parcialmente, inserir no imaginário público um mundo cuja vacinação faz parte da realidade cotidiana, por outro ainda não foi possível estabelecer um consenso entre a população sobre a real importância das vacinas. Uma possível explicação para a resistência de uma parte da população pode estar relacionada com teologias radicais e apocalípticas que associam os avanços científicos a conceitos como: “anticristo” e o “fim do mundo”. Neste contexto, as vacinas representam uma versão moderna do “marca da besta” (Apocalipse 13:18), a qual todos são obrigados a receber para terem direitos de comprar ou vender (fig. 2). 

Fig. 2. Campanha de desinformação e intolerância.

Um caso emblemático foi a nova revolta da vacina ocorrida em 17 de janeiro 2021, quando se iniciou a campanha de vacinação contra a Covid-19 juntamente com medidas  sanitárias que obrigavam a utilização de máscaras nos espaços públicos e a restrição da circulação de parte da população (quarentena) para contenção da incidência viral. No período de vigência da quarentena a apresentação da carteira de vacinação era obrigatória para que o contribuinte pudesse ter acesso a certos serviços e direitos essenciais, incluindo viagens nacionais e internacionais, entre outros. 

Para melhor entendimento, é preciso esclarecer que em 2020 o Brasil e o mundo passaram por uma grave crise sanitária acometida pela manifestação de um vírus mutante responsável por um tipo de síndrome respiratória aguda grave (Sars). O vírus se espalhou com intensidade e letalidade severa por todos os continentes deixando um rastro de morte, morbidade e pânico: O Covid-19. 

Foram tomadas medidas sanitárias para conter a pandemia de acordo com aquelas definidas na I Conferência Sanitária Internacional (1851), em que o isolamento e a quarentena aparecem na linha de frente para contenção primária da incidência viral. A contenção surge como estratégia mitigadora enquanto são testadas as eficácias de algumas vacinas experimentais.  Entretanto, a mistificação irracional da pandemia por grupos extremistas e anticiência, liderados pelo Presidente Jair Bolsonaro (2019 - 2022), empreendeu uma forte campanha anti-sanitária reforçada por fundamentalismos religiosos que facilitaram a propagação do vírus, levando à morte mais de 600.000 brasileiros em apenas um ano. Uma mortalidade maior do que a mortalidade somada por HIV, Dengue, Vírus Zica e a Chikungunya durante todo o período de suas incidências.

Como se tudo isso não fosse suficiente, o movimento antivacina ainda veio acompanhado de uma campanha irracional a favor de medicamentos comprovadamente ineficazes contra o Covid-19 e cientificamente testados como prejudiciais para o portador de comorbidades (fig. 3). 

Fig. 2. Campanha a favor de Cloroquina e Ivermectina:
medicamentos ineficazes contra COVID 19.

Portanto, no período entre 2020 a 2022, o Brasil passou por uma pandemia de proporções medievais associada a um "apagão cognitivo" que fomentou a desinformação e o discurso de ódio, demandando medidas de segurança e sanitárias severas e emergenciais. 

Bolsonaro governou até 2022, quando foi derrotado por uma frente ampla, democrática e suprapartidária liderada pelo então candidato e ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003 - 2011).

Fig. 3. Movimento golpista pró intervenção militar
 com Bolsonaro no poder.
A derrota de Bolsonaro deveu-se em grande parte a: 1. má gestão durante a pandemia; 2. discurso de ódio contra as minorias (mulheres, negros,  índios, LGBTs); 3. inúmeras tentativas de golpe militar (fig.3); 4. recursivas afrontas ao Superior Tribunal Federal (STF); 5. forte apelo armamentista, facilitando o acesso a armamentos de grosso calibre para os auto intitulados “cidadãos de bem”. 

Infelizmente, as contingências pelas quais o Brasil passou desde 2016 até a derrota de Bolsonaro em 2022, levaram a uma queda da cobertura vacinal que deixou a população vulnerável a uma série de doenças que haviam sido erradicadas, tais como: Sarampo, Poliomielite, Difteria e Rubéola.

 É necessário que existam oposicionistas à ciência para que se possa calibrar com precisão o grau de racionalidade das políticas púbicas de Saúde e Educação.

Cabe salientar que foi apenas a partir de 1930, durante o governo provisório de Vargas (1930 – 1934), que uma política nacional de saúde pública tomou forma com a instalação dos aparelhos necessários para a sua efetivação. Entre eles destacaram-se a criação do MESP (1930) e dos institutos de aposentadoria e pensões IAPs (1933).

Com os IAPs, a medicina previdenciária adquiriu robustez e progrediu. Entretanto, pela força histórica de suas próprias idiossincrasias assumiu um caráter restrito em termos de cobertura nacional. Neste sentido, ela contribuiu de forma importante para a consolidação da instalação de um Estado “burguês” dentro de um Estado paupérrimo. 

Em 1968, o grande educador e filósofo Paulo Freire, Patrono da Educação no Brasil, escreveu:

 Seria uma atitude ingênua esperar que as classes dominantes desenvolvessem uma forma de educação que proporcionasse às classes dominadas perceberem as injustiças sociais de maneira crítica” (Paulo Freire, 1968).

Sua fala reflete em cheio a realidade do que foi a acomodação política ajustada entre Getúlio Vargas e o coronelismo frente às aspirações sanitaristas. A convergência das verdadeiras oligarquias ia apenas até os pontos onde as ações de higienização contribuíam para o aumento da força de trabalho. Fora isso, a política dos coronéis não tinha interesse em uma educação emancipadora uma vez que igualdade de direitos e equidade não representavam projetos compatíveis com o lucro fácil advindo da exploração da mão de obra trabalhadora. 

O financiamento dos IAPs era tripartite, pois se tratava de um filão muito grande para ser administrado apenas por empregados e empregadores como no tempo das CAPs. Portanto, o Estado se uniu a eles assumindo o controle administrativo enquanto centralizava os recursos financeiros. Tanto que a partir da formação dos IAPs, a nomeação do escalão gerencial mais alto passou a ser feito pelo Presidente da República, e a nomeação dos representantes dos trabalhadores e patrões, pelos sindicados atrelados ao poder executivo.

Do ponto de vista dos sindicatos, a nomeação dos representantes dos trabalhadores ocorria por meio de eleição direta para que houvesse maior representatividade. Sob a gestão do Estado, a nomeação dos presidentes dos IAPs representava o interesse do Governo. Tal política gerou um problema crônico que perdura até os dias atuais, ou seja, a falta de recursos para financiar aposentados e pensionistas devido ao desvio de finalidade.

Portanto, os fatos históricos mostram que houve um reforço na dualidade entre as ações públicas de saúde ao longo do tempo, onde:

  • As ações de caráter coletivo e campanhista ficaram a cargo do MESP.
  • As ações individuais e curativas permaneceram vinculadas aos IAPs.

Para as pessoas que possuíam recursos, a medicina liberal era a alternativa mais viável, enquanto que para a maioria da população sem vínculo previdenciário restavam apenas as práticas populares semelhantes aquelas praticadas no Brasil colônia ou, quando muito, os hospitais de caridade.

Neste Brasil de saúde precária e assistência elitizada, as reformas administrativas de Vargas favoreceram o deslocamento do polo econômico do interior do Brasil para os centros urbanos em função do investimento maciço no setor industrial centro-sul.

Fig. 4. Êxodo rural.
Essa política promoveu o êxodo rural da Região Nordeste para Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, contribuindo para uma urbanização precária com formação de grandes favelas nas metrópoles, tornando ainda pior as condições de saúde das populações (fig. 4).





Continua...

Referências

1. CASTRO-SANTOS, Luíz Antonio; FARIA, Luíz. Os primeiros centros de saúde nos Estados Unidos e no Brasil: um estudo comparativo. Teoria e Pesquisa. Rio de Janeiro: v. 40, n. 41, p. 137-181, 2002.

Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_nlinks&ref=000037&pid=S0102-311X200900090002300006&lng=en. Acesso em: 20 de fev. 2021. 

2. JUNIOR, Aluisio Gomes da Silva; ALVES, Carla Almeida. Modelos Assistenciais em Saúde: desafios e perspectivas. In: MAROSINI, Marcia Valéria; CORBO, Anamaria D’Andrea (org.). Modelo de atenção e a saúde da família. Rio de Janeiro: FIOCRUZ. 2007. p. 1– 5. Disponível em: https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/8459/1/modelosassistenciaisemsa%C3%Bade.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2021. 

3. ESCOREL, Sarah. As Origens do Movimento Sanitário. In: ESCOREL, Sarah. Reviravolta na saúde: origem e articulação do movimento sanitário. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1999. p. 19-51. Disponível em: https://static.scielo.org/scielobooks/qxhc3/pdf/escorel-9788575413616.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2021.

4. PAIM, Jairnilson; TRAVASSOS, Claudia; ALMEIDA, Celia.; BAHIA, Ligia; MACINKO, James. O Sistema de Saúde Brasileiro: história, avanços e desafios. Salvador: The lancet. v. 6735, n. 11, p. 60054-60058, 2011. Disponível em: https://actbr.org.br/uploads/arquivo/925_brazil1.pdf, Acesso em: 20 de fev. 2021. 

5. HAMILTON, Wanda; FONSECA, Cristina. Política, atores e interesses no processo de mudança institucional: a criação do Ministério da Saúde em 1953. Rio de Janeiro (RJ): Hist. cienc. saude-Manguinhos. v. 10, n. 3, p. 791-825, 2003. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702003000300002&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 20 de fev. 2021.

6. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro (RJ). Paz & Terra, 1968. Disponível em: https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2021.

7. AGUIAR, Zenaide Neto. SUS. Sistema Único de Saúde: antecedentes, percurso, perspectivas e desafios. São Paulo: Martinare, 2011. Disponível em: Biblioteca Pearson. Acesso em: 20 de fev. 2021.

8CORDOBA, Elisabete. SUS e ESF: Sistema Único de Saúde e Estratégia Saúde da Família. São Paulo: RIDEEL, 2013. Disponível em: Biblioteca Pearson. Acesso em: 20 de fev. 2021.

9. BUSATO, Ivana Maria Saes; GARCIA, Lavana de França; GARCIA, Izabelle Crstina. SUS: estrutura organizacional, controle, avaliação e regulação. Curitiba: Intersaberes, 2019. Disponível em: Biblioteca Pearson. Acesso em: 20 de fev. 2021.

10. PONTE, Carlos Fidelis; FALLEIROS, Ialê. Na corda bamba de sombrinha: a saúde no fio da história. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2010. Disponível em:  https://www.epsjv.fiocruz.br/publicacao/livro/na-corda-bamba-de-sombrinha-a-saude-no-fio-da-historia?fbclid=IwAR27drgpe3QCLjst9GT1a_Xn-MEscaNoGmLJOW70o2--zuVzte1mJFTsyY0

Midiateca

Mídia 1

Era Vargas: o Estado Novo (1937-1945) 

Descrição/Sinopse da mídia:

Características gerais do período chamado de Estado Novo. 

Fonte da mídia:

https://www.youtube.com/watch?v=Gxrh6YoMT50.

 

Mídia 2

Questões políticas do segundo governo Vargas contribuíram para a criação do MS, há 60 anos. 

Descrição/Sinopse da mídia:

A criação do Ministério da Saúde em 1953. 

Fonte da mídia:

https://agencia.fiocruz.br/quest%C3%B5es-pol%C3%Adticas-do-segundo-governo-vargas-contribu%C3%Adram-para-cria%C3%A7%C3%A3o-do-ms-h%C3%A1-60-anos. 

 

Mídia 3 

O golpe de 1964. 

Descrição/Sinopse da mídia:

Reportagem sobre a ditadura militar, suas causas e consequências. 

Fonte da mídia:

https://www.youtube.com/watch?v=VZBgoV9HFFs.

 

Capítulo 3/2: A Reforma do Ministério da Educação e Saúde Pública.


A Reforma do Ministério da Educação e Saúde

Pública.


Prezado (a) amigo (a), se quiser utilizar o meu trabalho como referência para o seu trabalho, siga o modelo abaixo.

ROMANHA, Waldemiro de Souza. A criação do Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP) e a reforma administrativa de Vargas. In: ROMANHA, Waldemiro de Souza. Políticas Públicas de Saúde. Rio de Janeiro: UVA, 2021. p. 45 – 60. Disponível em:


governo provisório (1930-1934) correspondeu a um período em que Getúlio Vargas governou o Brasil após a Revolução” de 1930. O jogo rasteiro da época fez com que uma classe de oligarcas, apoiada por militares, contestasse o predomínio político e econômico dos produtores rurais que se revezavam no poder as custas de muita propina e negociatas. Como resultado veio o golpe militar.

Neste período, como já sabemos, o processo de institucionalização da saúde se bifurcou e deu origem a duas instâncias políticas distintas que dividiam as ações de saúde. A primeira instância foi o Ministério da Educação e Saúde Pública (MESP) que controlava as ações de saúde pública voltadas para as campanhas de saneamento. A segunda instância foi o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC), que fazia a gestão da medicina assistencialista no âmbito dos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAPs). 

É importante que tenhamos de forma bem assertiva este aspecto estrutural das políticas de saúde, pois apesar das aparências, não era aleatório. Havia uma estratégia na consolidação desta dualidade para que se concretizassem as aspirações getulistas de se construir um Estado forte e centralizado. O sucesso de tais objetivos dependia da construção de um aparato que conjugasse a ação governamental nas esferas Federal, Estadual e Municipal. Portanto, a criação do MESP era a resposta a estas aspirações. 

Foi assim que o Governo Vargas se estruturou como um Estado Nacional, centralizador e intervencionista, capaz de responder com políticas sociais aos conflitos urbanos e rurais por meio do MTIC e do MESP. Nestes contextos, eram definidas ações prioritárias de combate a doenças em diferentes regiões, requerendo a formação de profissionais especializados que garantissem a capilarização do poder estatal por meio de novas campanhas sanitárias. O viés centralizador do Estado visava o aprofundamento dos processos de expansão dos aparelhos estatais para que assumissem cada vez mais o controle das políticas públicas em todo o território nacional de forma unificada. 

O governo provisório chegou ao fim com a promulgação da Constituição de 1934 que instituiu:     

  • O voto secreto;
  • O voto feminino;
  • As leis trabalhistas.

Com o fim do governo provisório, começou o governo constitucional (1934 – 1937) em que Vargas foi eleito indiretamente para a presidência do Brasil. Entretanto, em 1937, no último ano do governo constitucional, sob o pretexto de uma suposta ameaça comunista, Getúlio Vargas decretou estado de guerra e fechou o congresso brasileiro. Este novo golpe de estado deu início ao Estado Novo que durou oito anos (1937 – 1945).

 E assim, de golpe em golpe, a nossa história foi se configurando.

Em 1937, após intensa reestruturação, o MESP passou a ser chamado de Ministério da Educação e Saúde (MES). Seu ministro Gustavo Capanema e seu diretor João de Barros Barreto empreenderam uma reforma administrativa que normatizou as ações de saúde em nível nacional, para que os Estados seguissem os mesmos regulamentos da União.

Gustavo Capanema

Portanto, a partir de 1937 o modelo enfraquecido do sanitarismo campanhista ficou sob a gestão do Ministério da Educação e Saúde, cuja função era controlar, a partir de medidas intervencionistas, as ações de saúde pública no Brasil. A estrutura do MES era constituída pelo Departamento Nacional de Educação (DNE) e pelo Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP).

Neste período foram criados:

1. Os Serviços Nacionais de Febre Amarela, Hanseníase e Câncer,          entre outros;

2. O Serviço de Malária do Nordeste;

3. A Fundação Serviço Especial de Saúde Pública (SESP).

A política de saúde do Ministério Capanema foi um dos pilares que direcionou os ideais sanitaristas a uma concepção de saúde como um direito universal. Durante todo o período varguista, os sanitaristas lutaram por um serviço de saúde que fosse abrangente e destinado a toda a população. Entretanto, em termos práticos, este objetivo jamais foi alcançado, a não ser com a criação do SUS muitas décadas depois. 

Em 1941 ocorreu a primeira conferência Nacional de Saúde no Rio de Janeiro (Castro & Faria, 1999), e desde então se constituiu em um fórum nacional onde os debates sobre políticas públicas de saúde foram sendo aprimoradas.

Coube a Capanema e a João de Barros Barreto o mérito pela consolidação da estrutura administrativa da saúde pública durante o Estado Novo. A grande reforma sofrida pelo MESP que culminou com a criação do MES consolidou uma política de saúde que durou até a criação do Ministério da Saúde (MS) em 1953, uma antiga aspiração dos sanitaristas. A principal característica do MES foi o estabelecimento de quatro eixos orientadores: a educação, a saúde pública, a assistência social e a cultura.

Na saúde pública foram criadas as Delegacias Federais de Saúde, as Conferências Nacionais de Saúde e os Serviços Nacionais de Saúde.

1.    Delegacias Federais de Saúde – DFS

As Delegacias Federais de Saúde foram instaladas em oito diferentes regiões do território nacional sendo elas: Rio de Janeiro, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, São Paulo, Porto Alegre e Belo Horizonte. Desta maneira, o Estado ampliou a sua presença controlando as ações de saúde pública nos Estados e Municípios.

2.    Conferências Nacionais de Saúde – CNS

As Conferências Nacionais de Saúde se constituíram em fóruns nacionais de caráter oficial que reuniam delegações de todos os estados para debater temas de saúde pública com base na conjuntura política da época, e definir os rumos a serem tomados. 

Segundo Capanema, as CNS eram:

“(...) conferências de administradores com objetivo de estudar e assentar providências de ordem administrativa, e coordenar a execução dos planos nacionais estabelecidos.”

Durante toda a década de 1940, os sanitaristas aspiraram pela criação de um Ministério que fosse exclusivamente da saúde. A primeira conferência nacional ocorreu em 1941 e expressou a influência do ideário sanitarista representado por expoentes como Oswaldo Cruz, Carlos Chagas, Artur Neiva e Belisário Pena que ainda eram lendários no imaginário sanitarista.

Dentre as principais proposições aprovadas em 1941, destacam-se:

·  A centralização da função administrativa e das ações de saúde pública nas mãos do MES.

· A manutenção da possibilidade de acordos entre Estados e Governo Federal sobre projetos de saúde.

 

3.    Serviços Nacionais de Saúde – SNS

Os Serviços Nacionais de Saúde foram criados para reorganizar o Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP). Assim, as ações de combate às doenças infectocontagiosas passaram a ter absoluta prioridade através de programas que atingiriam a totalidade da comunidade nacional. Do ponto de vista estrutural, cada SNS supervisionaria uma determinada área do território nacional através de um diretor específico. Os SNS aturariam, em conjunto com as DFS e os governos locais, para debelar surtos epidêmicos e estabelecer métodos de controle e prevenção. Dessa maneira, o governo federal aumentaria sua presença no interior do país conjugando centralização política com descentralização administrativa (Hamilton & Fonseca, 2003).

Durante o período que durou o Estado Novo, além de todos os avanços no campo da saúde pública, também se consolidaram a justiça do trabalho e as leis trabalhistas (CLT).

Em 1941, em plena segunda guerra mundial, o Brasil sofreu intensa pressão dos Estados Unidos para sair da neutralidade e apoiar os Países Aliados contra a Alemanha Nazista e os demais países do eixo (Itália e Japão). Isto incluía ameaça de invasão territorial caso o Brasil não concordasse. Por mais estranho que fosse, havia uma real possibilidade de o Brasil romper a sua neutralidade e apoiar os nazistas, visto que a ditadura de Vargas tinha um caráter fascista. Tanto que o General Góis Monteiro, que sempre esteve no governo Vargas, era a favor de declarar guerra aos ingleses.

Entretanto, na impossibilidade de viabilizar tal intento, Getúlio Vargas aproveitou para barganhar com o governo estadunidense e obter financiamento para a construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), que supriu os aliados do aço necessário para a indústria bélica norte-americana (fig. 2). Com a derrota dos nazifascistas na Europa, a ditadura de Vargas perdeu apoio, e em 1945 Vargas foi destituído do poder pelo General Góis Monteiro. No mesmo ano, novas eleições ocorreram e o General Eurico Gaspar Dutra subiu ao poder. E assim terminou o Estado Novo.

Fig. 2. Companhia Siderúrgica Nacional (CSN)


Continua...


Referências

1. CASTRO-SANTOS, Luíz Antonio; FARIA, Luíz. Os primeiros centros de saúde nos Estados Unidos e no Brasil: um estudo comparativo. Teoria e Pesquisa. Rio de Janeiro: v. 40, n. 41, p. 137-181, 2002.

Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_nlinks&ref=000037&pid=S0102-311X200900090002300006&lng=en. Acesso em: 20 de fev. 2021. 

2. JUNIOR, Aluisio Gomes da Silva; ALVES, Carla Almeida. Modelos Assistenciais em Saúde: desafios e perspectivas. In: MAROSINI, Marcia Valéria; CORBO, Anamaria D’Andrea (org.). Modelo de atenção e a saúde da família. Rio de Janeiro: FIOCRUZ. 2007. p. 1– 5. Disponível em: https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/8459/1/modelosassistenciaisemsa%C3%Bade.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2021. 

3. ESCOREL, Sarah. As Origens do Movimento Sanitário. In: ESCOREL, Sarah. Reviravolta na saúde: origem e articulação do movimento sanitário. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1999. p. 19-51. Disponível em: https://static.scielo.org/scielobooks/qxhc3/pdf/escorel-9788575413616.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2021.

4. PAIM, Jairnilson; TRAVASSOS, Claudia; ALMEIDA, Celia.; BAHIA, Ligia; MACINKO, James. O Sistema de Saúde Brasileiro: história, avanços e desafios. Salvador: The lancet. v. 6735, n. 11, p. 60054-60058, 2011. Disponível em: https://actbr.org.br/uploads/arquivo/925_brazil1.pdf, Acesso em: 20 de fev. 2021. 

5. HAMILTON, Wanda; FONSECA, Cristina. Política, atores e interesses no processo de mudança institucional: a criação do Ministério da Saúde em 1953. Rio de Janeiro (RJ): Hist. cienc. saude-Manguinhos. v. 10, n. 3, p. 791-825, 2003. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702003000300002&lng=pt&tlng=pt. Acesso em: 20 de fev. 2021.

6. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro (RJ). Paz & Terra, 1968. Disponível em: https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf. Acesso em: 20 de fev. 2021.

7. AGUIAR, Zenaide Neto. SUS. Sistema Único de Saúde: antecedentes, percurso, perspectivas e desafios. São Paulo: Martinare, 2011. Disponível em: Biblioteca Pearson. Acesso em: 20 de fev. 2021.

8CORDOBA, Elisabete. SUS e ESF: Sistema Único de Saúde e Estratégia Saúde da Família. São Paulo: RIDEEL, 2013. Disponível em: Biblioteca Pearson. Acesso em: 20 de fev. 2021.

9. BUSATO, Ivana Maria Saes; GARCIA, Lavana de França; GARCIA, Izabelle Crstina. SUS: estrutura organizacional, controle, avaliação e regulação. Curitiba: Intersaberes, 2019. Disponível em: Biblioteca Pearson. Acesso em: 20 de fev. 2021.

10. PONTE, Carlos Fidelis; FALLEIROS, Ialê. Na corda bamba de sombrinha: a saúde no fio da história. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 2010. Disponível em:  https://www.epsjv.fiocruz.br/publicacao/livro/na-corda-bamba-de-sombrinha-a-saude-no-fio-da-historia?fbclid=IwAR27drgpe3QCLjst9GT1a_Xn-MEscaNoGmLJOW70o2--zuVzte1mJFTsyY0

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Mídia 1

Era Vargas: o Estado Novo (1937-1945) 

Descrição/Sinopse da mídia:

Características gerais do período chamado de Estado Novo. 

Fonte da mídia:

https://www.youtube.com/watch?v=Gxrh6YoMT50.

 

Mídia 2

Questões políticas do segundo governo Vargas contribuíram para a criação do MS, há 60 anos. 

Descrição/Sinopse da mídia:

A criação do Ministério da Saúde em 1953. 

Fonte da mídia:

https://agencia.fiocruz.br/quest%C3%B5es-pol%C3%Adticas-do-segundo-governo-vargas-contribu%C3%Adram-para-cria%C3%A7%C3%A3o-do-ms-h%C3%A1-60-anos. 

 

Mídia 3 

O golpe de 1964. 

Descrição/Sinopse da mídia:

Reportagem sobre a ditadura militar, suas causas e consequências. 

Fonte da mídia:

https://www.youtube.com/watch?v=VZBgoV9HFFs.


 
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